CRISTOVAM BUARQUE

A fase do “outrismo”

Pais não querem uma escola melhor: querem outra

Por Da Redação
Publicado em 29 de março de 2019 | 03:00
 
 
Cesar Ogata/SECOM/PMSP

Na campanha eleitoral em 2018, um candidato ouviu do eleitor: “Você é o melhor, mas não votarei em você porque não quero o melhor, quero outro”. Foi essa posição de “outrismo” que levou à grande renovação dos Parlamentos e à eleição do presidente radicalmente diferente dos anteriores. 

Os políticos não perceberam seus erros, que aos poucos foram cansando os eleitores. É um sentimento parecido que está ameaçando as escolas: os pais não aguentam mais a situação e começam a buscar alternativas como a “militarização” ou “escola em casa”.

Não adianta falar de riscos da substituição de professores por militares, ou pelos próprios pais e professores particulares em casa. Cansados de indisciplina, os pais não querem necessariamente uma escola melhor, caíram também no “outrismo”: querem outra escola. Eles têm razão, mesmo se não estiverem certos: da mesma maneira que os eleitores tinham razão, mesmo que não tenham acertado.

Em nome de liberdade, ou comodismo, e quase sempre por falta de recursos, professores e diretores de escolas fecharam os olhos a atos de violência que provocaram, eventualmente, tragédias como a de Suzano, ou a gestos de indisciplina corriqueira de alunos contra professores e colegas.

No ponto a que chegamos, com o caos da indisciplina, a falta de respeito pelos professores, o descumprimento de regras básicas e a tolerância com o bullying, é difícil trazer a escola para um clima de liberdade com responsabilidade, respeito, dedicação ao aprendizado.

Precisamos entender que, ao longo de décadas, relaxamos na disciplina, não adaptamos metodologias aos alunos digitalizados, perdemos a sedução da escola que ensina o que ele precisa para enfrentar o mundo moderno.

Pensamos em fazer uma escola onde crianças e jovens se sentiriam soltos dentro da instituição, mas despreparados para serem livres, eficientes e felizes depois dela. Ao sentirem que a escola não os ajuda a construir suas vidas, os alunos caem no desamor e na raiva, e cresce a indisciplina.

Como está, não é possível continuar, mas a disciplina forçada militarmente na mesma concepção de escola não vai resolver e pode até agravar a tragédia. As escolas militares são boas não pela militarização, mas porque têm prédios bonitos, professores preparados e dedicados, e os alunos são estimulados para carreiras futuras. E porque, sendo poucas, os governos concentram recursos nelas.

A questão é entender nossos erros, fazer propostas sérias para mudar as escolas, inclusive com disciplina, exigindo a revolução educacional que os governos anteriores não quiseram fazer e o atual governo do “outrismo” caminha para piorar.

O mesmo vale para a ideia de escola em casa: é preciso entender por que as famílias desencantadas querem o “outro”, ao ponto de preferirem nenhuma. Correndo o risco de isolarem suas crianças, em ambientes ainda mais restritos do que estão os alunos em grande parte das escolas privadas de hoje.