Há tempos tramita no Congresso projeto para regulamentar o lobby, que prevê a atuação de lobistas cadastrados perante órgãos e entidades federais. O que sustenta sua necessidade? De pronto, a observação: houvesse transparência do sistema de pressão sobre a administração pública por parte de grupos interessados, teríamos fenomenal queda no índice de corrupção.

O lobby faz parte do processo de articulação da sociedade e significa expandir a democracia participativa. Há críticas, pois a atividade está estigmatizada, associada à corrupção ou à apropriação indevida do Estado.

Pincemos a lição de Bobbio: democracia é o governo do poder público em público. Sinaliza “manifestação, evidência, visibilidade”, contrapondo à coisa “confinada, escondida, secreta”. E arremata: “Onde existe o poder secreto há também um antipoder igualmente secreto ou sob a forma de complôs, tramoias”.

A intermediação público/privado surge nos ciclos históricos. Rousseau, em “Contrato Social”, falava da oportunidade de cada cidadão participar da política, pois há “interrelação contínua” do trabalho das instituições com as “qualidades psicológicas dos indivíduos que interagem em seu interior”. É o fundamento da democracia participativa: cidadãos e representações livres para influir no processo decisório.

O lobby bebe nessa fonte. Mas foi conspurcado à sombra do poder invisível, na confluência de interesses espúrios e alianças entre máfias e castas que se alimentam da corrupção. O Estado moral soçobrou diante do império imoral. A quebra da ética se acentuou em razão da despolitização e da desintegração das fronteiras ideológicas.

O cerco utilitarista se expandiu com novo triângulo do poder: partidos, burocracia administrativa e negócios privados. Desvirtuado do ideário, os lobbies viraram extensões de interesses escusos e fontes de escândalos. Ao mesmo tempo, entre nós, observou-se saudável movimentação da sociedade organizada, graças à Constituição de 1988. Afastados de partidos, milhares de cidadãos procuraram refúgio em núcleos comprometidos com suas expectativas (associações, sindicatos, movimentos etc).

Ocorreu o encontro de águas limpas com torrentes sujas. Diferentes tipos de interesse passaram a fazer pressão sobre os Três Poderes, reivindicando a salvaguarda de situações e direitos, enquanto setores antagônicos transferiam uns aos outros ônus e encargos. Jogo de soma zero.

Os lobbies contam com a ajuda de grupos incrustados na administração e outros, poderosos, atuando às margens do Estado.

Quando se divisa a legalização do lobby, a exemplo dos Estados Unidos, a abordagem é a de transparência. Lobistas terão nome e endereço e farão uma articulação aberta - modos de atuação, coletividades representadas e interesses.

O marco regulatório diminuirá a taxa de corrupção. A publicidade das ações distinguirá o justo do injusto, o lícito do ilícito, o gato da lebre. A democracia se aproximará de seu real significado: o regime do poder visível.