Marcio Coimbra

Márcio Coimbra escreve todas as quartas-feira em O TEMPO

Governabilidade em risco

Publicado em: Seg, 21/10/19 - 02h00

Jair Bolsonaro chegou ao Planalto impulsionado pelo sentimento de renovação na política, resultado da fadiga da Nova República, um movimento que começou com as manifestações de 2013. Este fluxo passou pelo impeachment, eleições de outsiders nos pleitos municipais, desgaste da classe política diante da operação Lava Jato e desaguou na sua escolha para o cargo de presidente da República em 2018.

Bolsonaro tornou-se o resultado deste processo, sem jamais ter liderado este movimento. O mesmo ocorreu com Fernando Collor na primeira eleição direta para presidente da República depois do fim do regime militar. Da mesma forma que Jânio Quadros e Collor, Bolsonaro foi eleito no pico de um ciclo de renovação política que ocorre a cada 30 anos. Entretanto, se busca um fim diferente, precisa mudar sua atitude perante o Congresso Nacional.

O racha no principal partido da base governista é apenas mais um sintoma de uma postura que segue fazendo vítimas desde o período da transição e o início do governo. Fato é que a boa política é feita com articulação e convergência, jamais mediante confronto e embate, armas que devem ser evitadas no parlamento. A criação de consensos e maioria ocorre por meio do diálogo e ponderação, elementos que somente fortalecem a democracia.

Governos que optaram pelo confronto com o Parlamento, acabaram vencidos. De nada adianta possuir excelentes técnicos nos ministérios, se não há liderança política no Legislativo para aprovar as medidas. Sem articulação efetiva, boas políticas se tornam simples propostas com enormes chances de derrota.

A criação de uma nova política deve evitar tornar-se a negação da boa política, confundida simplesmente com velhas práticas que devem ser esquecidas. Não podemos misturar as coisas. Se a nova política é uma prática baseada no confronto, em uma conexão direta com o povo, mobilizado pelas redes sociais, estamos diante apenas de mais uma vertente populista que trafega por um novo canal.

Ao rejeitar a boa política e incitar o confronto, corre-se o risco de colocar em xeque a estabilidade e a governabilidade, um movimento muito sério, que ao se prolongar pode gerar o fim prematuro de uma administração. Todo governante precisa de uma sólida base de apoio, calcada em um partido forte e coeso. Jânio e Collor, assim como Bolsonaro, foram eleitos por partidos pequenos, incapazes de consolidar-se como uma força estável no Parlamento. Se o atual governo deseja um fim diferente, precisa se reposicionar.

A estratégia do confronto coloca a governabilidade em risco. Bolsonaro chegou ao poder diante de uma onda de renovação, mas, para consolidar-se, precisa tornar-se um líder político efetivo, para além das urnas, alguém que inspire e crie unidade dentro de um programa claro e coeso, conduzindo uma ampla aliança de partidos que podem fornecer sustentabilidade ao seu projeto político. Qualquer movimento longe disso, pode encaminhar mais um governo brasileiro para um fim prematuro e melancólico.

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