Marcio Coimbra

Márcio Coimbra escreve todas as quartas-feira em O TEMPO

O discurso não realizado

Publicado em: Qua, 22/09/21 - 04h00

Ouça a notícia

“Senhoras e senhores, é uma honra abrir novamente a Assembleia Geral das Nações Unidas. Venho aqui mostrar o Brasil real. O Brasil mudou, e muito, depois que assumimos o governo, em janeiro de 2019.

Enquanto estou falando diante de todos vocês, nosso país beira as 600 mil mortes por Covid-19. Vivemos uma tragédia sem precedentes. Somos o segundo país em mortes absolutas e o oitavo em mortes por 1 milhão de habitantes. Nós erramos no combate ao vírus, primeiro por meio de um obscuro negacionismo, mas também por acreditar em um tratamento precoce que se mostrou comprovadamente ineficaz, custando vidas preciosas de nossos cidadãos. Depois de rejeitar, apostamos tardiamente nas vacinas, tendo alcançando até o momento somente 38,1% da população totalmente imunizada.

O Brasil entrou novamente no mapa do desmatamento. Somente em agosto perdemos o equivalente a oito vezes a cidade de Belo Horizonte em floresta desmatada. Nos dois primeiros anos de meu governo, houve aumento na média de desmatamentos de 6.719 quilômetros quadrados (cinco anos anteriores) para 10 mil quilômetros quadrdados. Nossa política ambiental falhou, e a liderança do Brasil no tema hoje está comprometida, rompendo com o posicionamento histórico do nosso país.

A economia também sofre, tanto com a pandemia quanto com os desacertos de nosso governo. O dólar disparou, e nossa moeda derreteu. A inflação cresce de forma perigosa e já coloca em risco a segurança alimentar dos brasileiros. Mais de 10% da população está subalimentada, e a pobreza extrema afeta 14 milhões de famílias. A escalada dos preços também atingiu os combustíveis, e estamos diante da iminência de um apagão por falta de chuvas e investimentos em infraestrutura.

O combate à corrupção, uma bandeira que me levou ao poder, perdeu o fôlego. Forcei a demissão do então ministro Sergio Moro, que comandava a pasta da Justiça, na mesma medida em que acabei com a Lava Jato. Hoje, o Senado investiga meu governo por suspeita de corrupção na área da saúde pelo uso indevido de verbas em negociatas para compra de vacinas e a implementação de tratamento precoce ineficaz.

A instabilidade institucional ronda o Brasil, é verdade. Eu me esforço todos os dias para fomentar esse caminho, criando atritos com o Legislativo, mas especialmente com o Judiciário. Minha postura afasta investidores, atrasa a recuperação da economia e cria conflagração social. Comecei também a questionar o sistema eleitoral brasileiro, que sempre me elegeu, abrindo caminho para colocar em dúvida o resultado das urnas no próximo ano.

Em meu país, 30 milhões de pessoas vivem na pobreza, 16% não têm água tratada, e 47% não têm acesso à rede de esgoto. Vivemos um desemprego recorde de 14,7%, sem contar subempregados e desalentados. Nossa educação ainda não encontrou um caminho para se recuperar da pandemia. Os números são alarmantes.

O mundo precisa se recuperar dos desdobramentos da Covid-19, mas o Brasil precisará se curar das tristes marcas que meu governo deixará.
Jair Bolsonaro.”

 

---

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo mineiro, profissional e de qualidade. Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar.

Siga O TEMPO no Facebook, no Twitter e no Instagram. Ajude a aumentar a nossa comunidade.