Marcio Coimbra

Márcio Coimbra escreve todas as quartas-feira em O TEMPO

Tempos Estranhos

Publicado em: Seg, 20/01/20 - 03h00

Impulsionada por Bolsonaro, uma nova direita chegou poder no Brasil. O desembarque deste grupo no Planalto foi embalado pelo antipetismo e pela troca de ciclo político, especialmente diante da fadiga da nova República e do desgaste do eterno duelo entre tucanos e petistas. Impulsionados por esta onda, chegaram em Brasília novos nomes que, aos poucos, começaram a ocupar a administração pública e o Parlamento.

A ascensão desta nova direita tem o condão de reação. Nasceu como antítese do sistema, outsider na política e antagonista de seus mecanismos. Encarnava simplesmente a mudança. Não se preparou para ocupar o poder, chegando de supetão em meio a uma troca de ciclo político. Faltou formar quadros, ocupar espaços, inserir-se no debate político de forma efetiva e real.

O exemplo mais recente ocorreu com o breve ocupante da pasta da Cultura, Roberto Alvim, que se viu envolvido em uma polêmica de dimensões globais diante de um vídeo bizarro em que aparece parafraseando trechos de um discurso de Joseph Goebbels ao som da ópera Lohengrin, do compositor alemão Richard Wagner, o preferido de Adolf Hitler. O discurso vai além, copiando também trechos idênticos do original e o enquadramento da fala do chefe da propaganda nazista. O vídeo é um erro do início ao fim. Sinais de tempos estranhos.

Alvim, assim como outros, não possui credenciais mínimas para ocupar um cargo desta envergadura. Culpar a assessoria ou uma trama opositora somente faz com que o caso se torne ainda mais patético. No plano político, seu compromisso passa longe das credenciais de um conservador, que, infelizmente, no Brasil passou a confundir-se com qualquer vertente de direita. Um conservador preferiria citar Churchill a Goebbels e entende que uma pasta com tais atribuições não deveria sequer existir.

Na verdade, um conservador observa o princípio da prudência, o fato de que a natureza humana é uma constante e as verdades morais são permanentes, aderindo ao costume, convenção e à continuidade. Ao mesmo tempo, defende o princípio da variedade, uma diversidade sadia, opondo-se ao coletivismo involuntário e percebendo uma prudente contenção do poder. A mudança para um conservador é aceita na medida em que a sociedade internaliza novos valores, preservando os princípios norteadores basilares de nossa civilização.

Modelos políticos de extrema esquerda, como comunismo, ou de extrema direita, como o nazi-fascismo se equivalem, pois ambos fazem uso de mecanismos totalitários, autoritários ou mesmo autocráticos. Nada que rime com democracia, um dos princípios basilares dos conservadores.

A nova direita brasileira ainda tem um caminho árduo a ser percorrido. Um trilha que passa pela formação de quadros, estudo de conceitos e ideias. Caso contrário, pode transformar-se numa versão tosca de um populismo tupiniquim que, ao flertar com atitudes autocráticas, passa ao largo do conservadorismo, seus reais valores e objetivos, como a liberdade e a democracia. Uma falta de preparo que pode custar muito caro e asfaltar o caminho para a volta dos antigos protagonistas ao poder. A conferir.

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