A realeza está estampada nas mídias sociais pelo fim do reinado da rainha da Inglaterra, Elizabeth II. Sua atuação como chefe de Estado e como figura histórica em seus 70 anos de governo é inegável. Mas, mesmo considerando o lema: “O rei morreu, viva o rei!”, com ela morre uma personificação de ser humano e de uma visão diferenciada de poder que se transformou mesmo dentro do peso do sistema.
Para muitos, a figura carismática de sua majestade deixa uma marca na humanidade e em nossos imaginários. Discreta e consciente de seus deveres, tornou-se uma referência de pessoa e de segurança.
Em meio a tantos desafios familiares, econômicos e políticos, apontou comportamentos e buscou valores humanos. Ao contrário da fábula que recordo a seguir, seu papel foi, a meu ver, fazer olhar o fato, o efetivo e seguir. Enquanto outros tantos líderes pelo mundo criam cenários para que sejam vistos como poderosos e inteligentes, a morte da rainha nos recorda a busca pela verdade. Vai com ela um pouco das nossas lutas pelo melhor do ser humano. O apelo da fábula é para que possamos ver o óbvio, sem ilusões.
A fábula a que me refiro, escrita na primeira metade do século XIX pelo dinamarquês Hans Christian Andersen, tem grande valor histórico e ainda se faz entender. De forma resumida: era uma vez um bandido espertalhão e um rei muito vaidoso. O falsário prometeu uma roupa de beleza incomparável que só as pessoas inteligentes poderiam ver. O rei ordenou a execução da peça, e o falso alfaiate recebeu materiais exóticos e botões de ouro.
Quando na primeira apresentação da roupa o “alfaiate” mostrou a mesa de trabalho vazia, o rei exclamou: “Que lindas roupas! Que trabalho magnífico!”, embora não visse nada além de uma simples mesa, pois dizer que nada via seria admitir na frente de seus súditos que não tinha a capacidade necessária para ser rei. Os nobres ao redor soltaram falsos suspiros de admiração pelo trabalho do bandido. Nenhum deles, por certo, queria passar por medíocre ou incapaz. Por fim, quando o monarca entrou no salão real com a veste, uma criança inocente percebeu o que acontecia e gritou: “Coitado do rei, está nu! O rei está nu!”
Onde estamos todos no roteiro dessa fábula? Um pouco de rei? Um pouco de alfaiate? O povo que aclama? Os súditos que não se posicionam? Que o exemplo dessa vida que se encerra feche nosso imaginário quanto aos contos de fada e de vidas de princesas e reis. Construir um povo e uma nação pede dedicação, compromisso, novas e outras atitudes de inclusão e respeito. Boas escolhas.
*Otávio Grossi, é filósofo, mestre em psicologia, graduando em psicologia, psicopedagogo de autistas. Mentor de empresários e atletas. Autor de “ Conquistas autênticas" e co-autor de “Sobre rodas”, das Edições Candido- RJ. É colunista fixo do jornal O Tempo e especialista do programa Interessa, nas quartas-feiras, na rádio Super FM.