O livro “Viagens com o Presidente”, de Eduardo Scolese e Leonêncio Nossa, foi lançado em 2006 e traz relatos sobre os bastidores do primeiro mandato de Lula. Em vez de embates ideológicos ou negociações para manter o apoio político, o foco é o comportamento do presidente – e da enorme corte palaciana – durante seus inúmeros deslocamentos profissionais pelo Brasil e pelo mundo. Além das muitas curiosidades, a narrativa de Scolese e Nossa tem um ponto estrutural que vale ser recordado: para os autores, o cotidiano na Presidência entediava Lula, enquanto as viagens, principalmente se incluíssem contato com o público, revigoravam plenamente seu ânimo. Durante o terremoto que foi a denúncia do mensalão em 2005, houve quem sugerisse a inclusão de viagens extras na agenda de Lula, como forma de animá-lo.
<CW-20>Esse mesmo “tédio presidencial” parece estar afligindo Jair Bolsonaro em seus três primeiros meses de mandato. Só que, em vez de buscar diversão nas viagens como fazia Lula, o atual presidente parece preferir como alento a recordação de seus turbulentos anos como deputado federal. As explosivas postagens que Bolsonaro tem feito nas redes sociais, portanto, só parecem fazer algum sentido se vistas como fuga da rotina encontrada na nova função; pois, sob qualquer outra perspectiva, os comentários online do presidente não fazem qualquer sentido.

O vídeo de conteúdo pornográfico que Bolsonaro compartilhou durante o Carnaval, por exemplo, teve repercussão negativa mundial e colocou analistas de investimento questionando a capacidade do presidente brasileiro para manter a estabilidade que o país precisa para voltar a crescer. Assim, os movimentos do dólar e da Bolsa de Valores e as expectativas de investimento produtivo passaram a sintonizar a frequência das redes sociais de Bolsonaro, o que criou um novo fator negativo para a economia nacional.

A aventada defesa dos valores familiares, motivação alegada dessa postagem, faria sentido durante o período eleitoral, que teve a pauta dos costumes como um de seus destaques. Já eleito, empossado e até então com a popularidade em alta, Bolsonaro não tinha nenhum motivo para trazer à baila novamente seu embate com o PT – adversário que, hoje, se encontra na pior crise de sua história.

Seguiram na mesma linha postagens presidenciais sobre o golpe de 1964, o bate-boca com um ator de novelas e as comemorações pela prisão de Michel Temer e Moreira Franco; o único efeito político desse furor comunicativo foi uma crise com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, genro de Moreira Franco. Nada de bom há de vir de tais polêmicas, pois a essência do Poder Executivo é transformar demandas populares em resultados concretos, e nenhum entrevero digital de Bolsonaro pode contribuir para esse fim.

Para todos que precisam que o Brasil melhore e cresça, é urgente que Bolsonaro regule o uso de suas redes sociais: preferencialmente, que transforme seus perfis em enfadonhos canais de propaganda institucional de seu governo.