PAULO DINIZ

Senado não é uma festa, mas pode ser menos que isso

Algo mudou no Brasil, e isso chegou ao Legislativo

Por Da Redação
Publicado em 05 de fevereiro de 2019 | 03:00
 
 

Surpreendeu a todos a tumultuada disputa pela presidência do Senado, realizada no último fim de semana: a desordem foi grande o suficiente para vencer os senadores pelo cansaço, levando-os a suspender a sessão até o dia seguinte – um sábado –, sem acerto sobre a disputa.

Resumindo a confusão, que se estendeu por horas: em meio a um desentendimento sobre o regimento do Senado, a respeito de quem deveria conduzir a sessão de escolha do novo presidente, o amapaense Davi Alcolumbre tomou para si o poder, repelindo por mais de cinco horas os insistentes pleitos de muitos de seus colegas para que deixasse a Mesa Diretora. Sendo um dos candidatos da disputa em andamento, acreditava-se que Alcolumbre poderia não ser parcial. O problema se agravou quando o presidente em exercício colocou em votação uma proposta de institucionalização do voto aberto para a escolha do presidente do Senado, algo que foi aprovado.

Estava armado o impasse, sobretudo pelo conflito entre estratégias políticas dos grupos de senadores. Renan Calheiros, tão astuto quanto desgastado junto à opinião pública, se beneficiaria com o voto secreto: manteria no anonimato todos os acordos de bastidores que tinha feito para obter apoio. Por outro lado, o voto aberto preservaria a biografia de dezenas de senadores, afastando-os da imagem de um político impopular como Renan, principalmente se este acabasse eleito. Sabendo disso, Alcolumbre vinculou sua saída do comando do Senado à manutenção do voto aberto, e foi essa queda de braço entre as correntes políticas que se arrastou por horas.

No dia seguinte, vencidas as pendências sobre a interpretação regimental e a condução das eleições internas, a primeira votação apurou 82 votos – um a mais do que o total de membros do Senado. Antes que outro escrutínio fosse possível, Renan Calheiros desistiu da disputa, deixando o caminho livre para Alcolumbre vencer a eleição.

Mais importante do que compreender os pontos principais dessa tragédia é olhar para seus detalhes. Por exemplo, houve parlamentar que suplicasse para que Alcolumbre deixasse a Mesa Diretora do Senado porque, como era sexta-feira e dia de posse de dois terços da Casa, muitos senadores já tinham organizado festas para celebrar os novos mandatos. Era preciso solucionar o impasse para não atrasar o início dos eventos, o plenário vibrou em apoio.

Também é importante lembrar os incontáveis discursos que traziam acusações mútuas, entre os grupos de senadores estreantes e os mais experientes, sobre a responsabilidade na confusão que havia se instalado. Os termos “nova política” e “política tradicional” foram usados várias vezes, tanto como elogio quanto como ofensa, de maneira que ficou claro que o resultado das urnas de 2018 deixou cicatrizes.

Algo mudou no Brasil, e esse efeito acaba de chegar ao Legislativo federal. Convém acompanhar de perto cada um dos eleitos, para que o trabalho dos parlamentares tenha mais valor do que as festas da posse.