PAULO PAIVA

O enigma do crescimento em 2017

Por que a queda da inflação não melhorou a avaliação do governo?

Por Da Redação
Publicado em 26 de novembro de 2017 | 03:00
 
 

Muitas dúvidas surgiram aos primeiros sinais de crescimento da economia. De um lado, suspeitava-se que o aumento do PIB no primeiro trimestre seria apenas uma bolha em razão do impacto da colheita recorde de grãos. De outro lado, acreditava-se na impossibilidade de crescimento, mesmo que ainda modesto, em meio à severa crise política, com o presidente Temer na mira do MPF e tendo os mais elevados índices de rejeição das últimas décadas. Não obstante, as evidências da recuperação econômica continuaram nos meses seguintes, parecendo real, então, a possibilidade de a economia crescer, a despeito da crise política. A economia se descola da política? Como decifrar esse enigma do crescimento?

O Banco Central divulga mensalmente o IBC-Br, que é uma medida antecedente do PIB calculada com base no comportamento da agropecuária, da indústria e dos serviços e na arrecadação dos impostos sobre produtos. Esse índice serve como “proxy” para a estimativa oficial do PIB. A variação do IBC-Br no trimestre julho-agosto-setembro chegou a 0,58%, superior a 0,4% no trimestre anterior, embora inferior a 1,1% no primeiro trimestre, indicando crescimento persistente até então.

Ademais, a economia vai se acelerando ao longo do ano. Comparando as estimativas mensais do IBC-Br deste ano com as do mesmo mês no ano passado, verifica-se que desde maio sua trajetória é de alta: 0,45% em maio, 0,76% em junho, 1,4% em julho, 1,5% em agosto e 2% em setembro. Dessa forma, não será implausível se, no final do ano, a economia surpreender, atingindo variação entre 1% e 1,5%, superando as expectativas do FMI e do mercado brasileiro, que se situam em torno de 0,7%.

O principal fator responsável pelo crescimento é o aumento do consumo das famílias, principalmente da classe média-baixa, impulsionado pela queda da inflação. Se o IPCA acumulado em 12 meses, que mede a inflação de famílias com rendimentos compreendidos entre um e 40 salários mínimos, caiu de 7,87%, em outubro de 2016, para 2,7%, em outubro deste ano, no mesmo período, o INPC, que mede a inflação de famílias com rendimentos compreendidos entre um e seis salários mínimos, despencou ainda mais (de 8,5% para 1,8%). Alimentos apresentaram as reduções mais expressivas.

A queda da inflação tem efeito semelhante do aumento do salário, principalmente para famílias de renda mais baixa, cuja participação relativa dos alimentos no total dos gastos é bem maior. Por exemplo, para uma família que ganha R$ 2.000 por mês e compromete 70% de sua receita com alimentação, 10% de redução nos preços de alimentos equivale a um acréscimo mensal de R$ 140 em sua renda disponível. Essa disponibilidade é convertida em mais consumo, estimulando o comércio e, em consequência, os outros setores da economia.

O enigma a ser decifrado não é a razão pela qual a economia estaria se descolando da política, mas por que a queda expressiva da inflação não melhorou a avaliação do governo Temer.

São os mistérios da política, não da economia.