Paulo Paiva

Paulo Paiva

Professor associado da Fundação Dom Cabral, Paulo Paiva escreve às sextas-feiras

PRESIDÊNCIA

Lula, Madonna e a CLT

A aprovação do trabalho que o presidente vem fazendo é a mais baixa desde o início do seu terceiro governo

Por Paulo Paiva
Publicado em 09 de maio de 2024 | 19:44
 
 
 
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Maio não traz boas notícias para Lula. A aprovação do trabalho que o presidente vem fazendo é a mais baixa desde o início do seu terceiro governo, segundo pesquisa Genial/Quaest. Nos últimos nove meses, sua aprovação já caiu, consistentemente, 10 pontos percentuais, e os 50% atuais estão, estatisticamente, empatados com os 47% que desaprovam seu governo. Esses resultados mostram não só a queda na avaliação de seu trabalho como presidente, mas que os eleitores se dividem ao meio, como estavam no dia da eleição.

Isso já seria suficiente para tirar o sono do presidente, que sonha com o quarto mandato, mas não é só isso. No evento de 1º de maio, Dia do Trabalhador, organizado pelas centrais sindicais, o presidente ficou decepcionado com a presença de apenas um pouco mais de 1.500 pessoas, espalhadas pelo estacionamento do estádio do Corinthians, seu clube de coração.

À noite, em casa, Lula viu um filme passar em sua cabeça. No Dia do Trabalhador, multidões lotam o estádio de São Januário, no Rio de Janeiro, para aplaudir o ditador Getúlio dizer, emocionado: “Trabalhadores do Brasil”, e metalúrgicos concentrados, no estádio em São Bernardo, no final da década de 1970, ovacionam Lula, o líder inconteste nas greves, que representaram a força do novo sindicalismo que nascia das lutas contra a ditadura militar. Lágrimas escorreram pelo seu rosto.


No Rio de Janeiro, multidões se espalhavam pela praia de Copacabana em bolhas identitárias, LGBTQQICAAPF2K+, anarquistas, agnósticos, defensores de direitos sociais e fãs, todos eleitores, da esquerda ou da direita, entusiasmados, curtindo e ovacionando o rico espetáculo de Madonna. Muitos, de pronto, imaginam que a cantora pop conseguiu unir o Brasil. Não vou tão longe assim.

O derretimento do apoio ao Lula não está relacionado diretamente com a força mobilizadora de Madona, mas com seu apego ao passado. A força do movimento sindical dos anos 1970 e 1980 representava novas tendências nas relações trabalhistas, fundadas nas negociações coletivas e na liberdade sindical, que não cabiam nos limites da legislação trabalhista criada sob a tutela do Estado. Foi nessas condições contestadoras que surgiu a CUT.

Nos tempos atuais, as sociedades estão mais complexas, autonomia e digitalização mudaram os processos e as relações de trabalho, as identificações dos operários da indústria de transformação ultrapassaram os limites de “classe trabalhadora”, tornando-se mais universais. A tradicional luta de classe não mais os mobiliza.

Populismo pode atrair as massas sem vínculo com o trabalho formal, mas, dificilmente, empregados com carteira assinada e empreendedores. E corporativismo é coisa do setor público. Passada a meia-noite, Lula convida Janja para assistir ao filme “Evita” e ouvir Madonna cantar “Don’t cry for me, Argentina”.

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