Paulo R. Haddad

Professor emérito da UFMG e escreve às segundas-feiras em O Tempo

A peregrinação do crescimento

Publicado em: Qui, 20/06/19 - 03h00

Nos últimos dez anos, ocorreram diversas experiências de políticas econômicas que apresentam como um de seus objetivos a retomada do crescimento econômico do país. Com o passar do tempo, o crescimento surgiu e desapareceu, numa peregrinação fracassada.

Mais uma década perdida de desenvolvimento está se encerrando: a renda per capita do brasileiro, em 2018, é praticamente igual a de 2008. A economia mundial avança, e o Brasil vai ficando para trás, num evento que pode se denominar de “dinâmica da marcha a ré”, um passo à frente e dois para trás.

A questão da década perdida ganha maior visibilidade junto à opinião pública quando se observa que, nesse primeiro semestre de 2019, a taxa de desemprego entre os jovens trabalhadores de 18 a 24 anos caminha para mais de 30%, o dobro da taxa geral. Além do mais, o campo de oportunidades para que possam realizar os seus projetos de vida está se encolhendo cada vez mais.

Desde o início da década de 1980, as políticas de crescimento e de desenvolvimento no Brasil vêm sendo dominadas pela agenda de problemas de curto prazo. Após a implementação do II Plano Nacional de Desenvolvimento no governo Geisel, as questões conjunturais decorrentes dos desequilíbrios macroeconômicos do país vieram assumindo tamanha gravidade econômica e social, que o equacionamento das questões do desenvolvimento de médio e longo prazo foi sendo recorrentemente postergado.

Particularmente, o controle de um processo de inflação crônica passou a prevalecer sobre as políticas públicas, de médio e de longo prazo, que cuidam das soluções estruturais para os problemas da pobreza e da miséria, dos desequilíbrios regionais de desenvolvimento, do uso não sustentável dos recursos naturais do país, e, principalmente, da retomada de um ciclo longo de expansão econômica.

Essas políticas públicas não podem prescindir de programas e projetos estruturantes que buscam transformar tendências e padrões atuais dos processos de desenvolvimento socioeconômico e socioambiental ou que buscam mobilizar potencialidades e recursos latentes ainda não explorados da sociedade. Ademais, por serem inovadoras, essas políticas necessitam de uma intensa dose de inovação político-institucional e de ousadia comportamental na liderança dos processos de mudança.

Para que tenham sucesso no médio e no longo prazo, essas políticas precisam da institucionalização de ações programáticas persistentes, de centralidade administrativa, de status político na hierarquia de poder, de modelos de governança eficientes e eficazes. Contudo, o que se observa atualmente é a sua imersão num ambiente de incertezas e de aleatoriedades quanto aos recursos financeiros e institucionais de que dispõem, assim como sua frequente captura por interesses velados de natureza clientelística.

Buscar soluções para problemas econômicos de curto prazo, sem o balizamento de uma visão de perspectiva ou de futuro, leva a um equívoco histórico, pois uma sequência quase interminável de políticas de curto prazo pode conter políticas implícitas de efeitos não esperados ou indesejáveis sobre o longo prazo. Parafraseando Keynes, pode-se dizer que, de curto em curto prazo, no longo prazo estaremos todos mortos.

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