PAULO HADDAD

Quando morrem as florestas e os rios, reduz-se a riqueza econômica

Quem desmata e polui está destruindo parte do capital natural

Por Da Redação
Publicado em 16 de dezembro de 2018 | 03:00
 
 
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Há um provérbio italiano que diz “tra il dire e il fare c’è di mezzo il mare” para ilustrar que a distância entre as palavras e os atos continua a ser particularmente grande. Assim, espero que as falas da nova administração do governo federal sobre o que fazer com o meio ambiente se dissolvam no imenso mar dos preconceitos, da ignorância histórica e dos interesses velados.

Falas como “os países desenvolvidos não devem interferir em nossa política ambiental, pois historicamente destruíram grande parte dos seus próprios ativos ambientais”, ou “os bens da natureza estão aí apenas para atender as necessidades dos homens” são argumentos falaciosos e mitológicos para fundamentar qualquer decisão pública ou privada sobre o uso de recursos naturais renováveis e não renováveis à disposição do povo brasileiro. A sua implementação incondicional poderá contribuir para acelerar o aquecimento global, para aprofundar a crise hídrica e para provocar sensível queda no produto e na renda de algumas regiões, como demonstrou estudo da FEA/USP.

Quanto vale a natureza? Há muitas respostas para essa indagação. A avaliação da natureza, como propõe a ONU, além de incluir a análise econômica, funciona como um sistema de projeção cultural, que impõe um modo de pensar e uma forma de relacionamento com o meio ambiente, assim como reflete realidades particulares percebidas, cosmovisões, estruturas mentais e sistemas de crenças.

No caso da avaliação econômica é preciso considerar o Valor Econômico Total (VET), como recomendam a ONU e o Ibama. Os ecossistemas podem gerar valores de produção no seu estado atual, tais como produção de alimentos e de matérias-primas, regulação climática, polinização, serviços culturais e recreativos etc. Mas, mesmo que um ecossistema ou algum de seus componentes não esteja atualmente gerando nenhuma produção, o seu valor de opção ou de não uso pode ser muito significativo. Esse valor assegura que não haja nenhuma ação transformadora com consequências negativas irreversíveis para o bem-estar humano presente e futuro, como, por exemplo, a destruição de um banco genético pelo desmatamento de uma floresta prístina ou uma crise hídrica pela morte da vida orgânica de um rio.

Quem desmata áreas de uma floresta prístina (Amazônia, Mata Atlântica) ou polui um rio precisa saber que está destruindo o valor econômico de parte do capital natural que compõe a riqueza econômica de um país ou de uma região. O Estado do Pará, por exemplo, dispõe atualmente de maior riqueza econômica (três grandes bacias hidrográficas, imensa biodiversidade, províncias minerais, etc.) do que a riqueza econômica somada dos nove Estados do Nordeste, a qual foi degradada pelo uso não sustentável ao longo do tempo, desde o período colonial.

Ainda dentro do enfoque econômico, é preciso destacar que a natureza presta serviços ambientais de provisão, de regulação, de habitat, de cultura e lazer. São serviços sensíveis que impactam a produtividade total dos fatores de produção (compare a produtividade em duas propriedades agrícolas isomorfas no seu sistema produtivo em áreas de Cerrado no Centro-Norte de Mato Grosso e em áreas de Caatinga do sertão da Paraíba) e o bem-estar social sustentável (compare a qualidade do ar e de vida entre Pequim e a Serra Gaúcha).

Assim, tendo em vista a fragilidade do homem na Terra, que seja imenso e profundo o mar que separa as promessas eleitorais do processo de implementação das políticas públicas ambientais da nova administração do governo federal. Ou, como dizemos aqui, em Minas, para evitar qualquer desastre ou colapso ambiental, é preciso ir devagar, porque o santo é de barro.