PAULO HADDAD

Um mau começo

A atual equipe econômica teve tempo mais do que suficiente para elaborar e iniciar a execução de uma estratégia para o Brasil

Por Da Redação
Publicado em 08 de abril de 2019 | 03:00
 
 
Equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, é favorável à inclusão de Estados e municípios da reforma da Previdência José Cruz/Agência Brasil

Considerando o período entre o fim da eleição e o início de abril, a atual equipe econômica teve tempo mais do que suficiente, quase um semestre, para elaborar e iniciar a execução de uma estratégia de desenvolvimento para o Brasil no estilo Campos-Bulhões, em 1965. Uma estratégia que possa confrontar os problemas reais de nossa economia no curto prazo: combater o desemprego e o subemprego, estancar o processo de empobrecimento dos brasileiros, reorganizar as estruturas dos serviços públicos essenciais. Da mesma forma, seria indispensável que o novo governo apresentasse as suas propostas para o enfrentamento dos problemas estruturais da economia no médio e no longo prazo: os desequilíbrios regionais de desenvolvimento, o nosso atraso relativo na evolução científica e tecnológica, um novo pacto federativo, a erradicação da miséria etc.

Podemos destacar pelo menos três ambiguidades na condução da política econômica do país nesse início de governo. Ambiguidades que vão desde o seu marco conceitual até o seu marco ideológico e que poderão ser determinantes da trajetória da frustração popular nos próximos meses.

Em primeiro lugar, não é adequado colocar o processo de retomada do crescimento econômico e o equacionamento dos investimentos públicos na dependência de um único, ainda que inadiável, objetivo: a reforma previdenciária. Mesmo que bem-sucedida, o impacto maior dessa reforma se dará principalmente sobre as expectativas de solvência financeira do governo federal ao longo das duas próximas décadas. Pelas experiências dos últimos quatro governos, é bastante provável que, ao final das contas, o Congresso entregue uma redução de déficit fiscal bem menor do que esperado. O ajuste politicamente possível pode estar predestinado ao fracasso.

Em segundo lugar, o processo de desenvolvimento do Brasil é intrigantemente complexo, multifacetado e propenso a crises e a descontinuidades. Somos uma nação dividida pela renda e pela riqueza, pela diversidade cultural e pela diversidade ambiental, pelas poucas regiões ricas e as muitas regiões pobres. Não é possível tratar o nosso processo de desenvolvimento com políticas econômicas baseadas apenas em modelos abstratos da macroeconomia de curto prazo e suas mecânicas de quantidades globais.

Finalmente, por subestimar a complexidade estrutural e comportamental do nosso processo de desenvolvimento, o governo está envolto em crenças e ideologias do fundamentalismo de mercado, muitas das quais já perderam até mesmo sua validade histórica. Numa economia globalizada e intensamente competitiva, tem prevalecido, no mundo dos negócios, um elevado grau de pragmatismo iluminado, orientado para ganhos de comércio.

A superação dos nossos problemas socioeconômicos e socioambientais exige visão de longo prazo, paciência administrativa, sabedoria técnica e arte de negociação. Enquanto perdura a ambiguidade da atual administração do governo federal em matéria de política econômica, o tempo da crise econômica e social não para. O desemprego persiste, os serviços públicos se deterioram, e as desigualdades e assimetrias avançam. E o governo vai se configurando como um semeador e multiplicador de incertezas.