CINEMA

A realidade da periferia na tela 

Sesc Palladium recebe a primeira edição da mostra "Faces do Subúrbio" que lança olhares questionadores para periferia, enquanto espaço fílmico

PUBLICADO EM 29/07/17 - 03h00

 

“Registrar a periferia é um gesto político. Você demarca um problema, tem um princípio para questionar aquilo”, enfatiza o cineasta Affonso Uchoa, curador da mostra “Faces do Subúrbio: Cinema e Periferia”, cuja primeira edição será aberta na sexta-feira (4), no Sesc Palladium. 
 
Como o nome indica, e em consonância com a fala de Uchoa, a iniciativa abriga produções que abordam questões que pautam o dia a dia de parcelas da população pouco atendidas pelo poder público. Diretor do premiado “Vizinhança do Tigre”, o curador entende que, na citada demarcação de um problema, há um princípio para questionar aquilo. “Um filme conclama a inquietude de uma situação social, não há apaziguamento”, prossegue ele, para quem “a favela é uma fagulha da realidade”. “E o cinema lança um olhar político como um disparador de insatisfação sobre o que está acontecendo no Brasil”. 
 
A mostra abarca dois objetivos centrais. O primeiro, apresentar produções ambientadas no cenário da periferia, evidenciando a diversidade de temas, épocas, lugares e gêneros. “Tem documentário, ficção e filmes híbridos”. O outro foco está nos realizadores. “Mostrar como pessoas da periferia estão desenvolvendo a sua produção cinematográfica e investigar o que é peculiar nesse olhar que vem de dentro dela”.
 
Na verdade, algumas exibições não serão nem obras cinematográficas completas. “Vamos trazer videofilmes, clipes, exercícios de oficinas e produções mais ‘precárias’. Obras feitas na ‘raça’. Isso também mostra o cinema que é praticado ali, sem recursos, de forma colaborativa. A mostra também é uma vitrine para as mentes realizadoras da periferia”.
 
Uchoa acentua seu interesse em perscrutar a gênese de cada iniciativa. “Porque trata-se dos espaços mais evidentes da desigualdade social brasileira, onde é perceptível o aspecto da falta”, analisa. 
 
Grandes documentaristas serão lembrados na mostra. Caso de Aloysio Raulino (1947-2013), em filmes, como “Teremos Infância”, forte depoimento de vida de Arnulfo Silva, ex-menor abandonado que perambula no frenesi da São Paulo de 1971.
 
O celebrado Eduardo Coutinho (1933-2014) também é destaque. Em “Santa Marta: Duas Semanas no Morro”, ele flagra uma favela carioca de 1987. As insatisfações daquela comunidade ainda são latentes: a desigualdade e a violência policial. 
 
Outro chamariz que Uchoa cita é “Fim de Semana” (1976), de Renato Tapajós. O documentário retrata a autoconstrução de casas na periferia de São Paulo aos finais de semana: trabalhadores, no que seria seu descanso semanal, aproveitam para colocar a mão na massa em um clima de coletividade ímpar.
 
 
O Funk é Pop
 
“A Batalha do Passinho” também será exibido. O filme retrata não só a febre do passo de dança contemporâneo, mas toda a cultura da juventude periférica do Rio de Janeiro, que tem o funk como principal manifestação cultural. “Dá vontade de dançar, é um filme que se vê com o corpo”, exalta o curador. Após a exibição, o coletivo Lá da Favelinha apresentará uma Disputa Nervosa para refletir sobre a cena do passinho em BH, junto aos comentários do diretor do filme, Emílio Domingos.
 
Mostra Faces do Subúrbio: Cinema e Periferia
Sesc Palladium (r. Rio de Janeiro, 1.046, centro). De 4 a 17 de agosto. Confira a programação no roteiro desta edição.