Economia

‘Pedalada’ na energia e nos combustíveis pode maquiar inflação em ano eleitoral

Especialistas apontam problemas nas propostas que tendem a avançar no Congresso na volta do recesso

Por Heitor Mazzoco
Publicado em 21 de janeiro de 2022 | 17:00
 
 
Imagem ilustrativa de um carro sendo abastecido Foto: José Cruz/Agência Brasil

As medidas previstas para entrar na pauta do Congresso Nacional na retomada dos trabalhos em fevereiro para diminuir preços de combustíveis, gás de cozinha e energia são vistas como eleitoreiras e perigosas por especialistas consultados por O TEMPO.

As propostas analisadas no Congresso, inclusive, tendem a causar transtornos maiores a partir de 2023, quando o vencedor da eleição presidencial deste ano assumir o comando do Poder Executivo federal. Um dos motivos é que a queda da inflação com as intervenções do Congresso Nacional é vista como transitória. 

O mercado financeiro aposta em um Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em torno de 5,09% neste anop, como mostram os dados do mais recente relatório Focus divulgado no último dia 17 pelo Banco Central. Com isso, a inflação ficaria distante do centro da meta de 3,5% e fora, inclusive, do teto de tolerância, que é de 5%.

A inflação de 2021 fechou em dois dígitos: 10,06%. A gasolina, por exemplo, teve variação para cima de 47,49%. O gás de cozinha, 36,99% e a energia elétrica de 21,21%. Apenas a gasolina foi responsável pelo aumento de 2,33 pontos percentuais na variação do IPCA. 

Projetos para forçar a diminuição dos preços acarretarão uma queda de até R$ 3 nos combustíveis, por exemplo, como se prevê no Senado. No entanto, é uma medida paliativa, justamente em ano eleitoral, quando boa parte dos congressistas disputarão a reeleição em outubro. 

No Senado, o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) anunciou que deve pautar projeto de lei que cria um fundo de estabilização dos preços dos combustíveis. O relator da proposta é o senador Jean Paul Prates (PT-PI), e a meta é mudar a fórmula de reajuste dos preços dos derivados de petróleo, como a gasolina e o diesel, e controlar o valor que chega ao consumidor final.  

Queda de inflação será transitória, avalia professor da UNB

O professor de economia da Universidade Nacional de Brasília (UNB) Carlos Alberto Ramos explica que os governos (estaduais e federal) podem zerar os impostos dos combustíveis, mas o que vale o aumento do preço internacional. 

“O preço do combustível interno do Brasil depende do preço internacional e da taxa de câmbio. Então, na medida que se tenta reduzir impostos, tentar subsidiar pode ter redução na gasolina, no preço dos combustíveis e impactar a inflação de forma transitória. Porque você pode reduzir impostos em um momento do tempo. Você não pode reduzir impostos continuadamente. Então se você tem aumento do preço internacional ou valorização da taxa de câmbio, o preço da gasolina vai continuar aumentando”, disse Ramos. 

Apenas uma intervenção no modo de definição dos preços dos combustíveis junto à Petrobras poderia mudar o cenário. 

“Subsidiando gasolina vai contra a lógica internacional que diz ‘vamos depender cada vez menos de combustíveis fósseis’, que emitem CO2. No lugar de taxar esse tipo de combustível, você está subsidiando esse tipo de combustível. A política pública deveria ser procurar fontes alternativas de energia e deixar o petróleo”, afirma o professor. 

Mauro Martinelli, diretor do sindicato dos Urbanitários do Distrito Federal e representante da Coordenação do Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE), faz uma alerta sobre a tarifa de energia elétrica. Segundo ele, o governo tenta evitar aumento em 2022, mas não conseguirá segurar os valores para 2023.

“O que o governo vai fazer? Descotiza. Vai aumentando o preço ano a ano e, para compensar, ele pega o dinheiro da amortização tarifária e coloca para reduzir tarifa. Só que isso não vai conseguir reduzir a tarifa. A descotização começaria em 2023, caso a Eletrobras seja privatizada. Este aporte o governo quer fazer um mês após a privatização no valor de R$ 5 bilhões para evitar o tarifaço ainda em 2022 (deixando-o para o ano que vem)”, disse.

Para Martinelli, a estratégia para reduzir tarifa é eleitoreira. “Em relação ao setor elétrico, nós garantimos ao povo brasileiro que essas medidas que estão sendo tomadas são eleitoreiras para evitar tarifaço agora em 2022. Mas a partir de 2023 vai ter um aumento brutal da tarifa de energia. O presidente atual está arrumando uma arapuca para o próximo presidente”, disse Martinelli. 

O diretor do sindicato cita, por exemplo, a tentativa de privatização da Eletrobras, que gera 30% da energia do país. “A privatização vem acompanhada da piora da energia e no aumento da tarifa. O preço feito pela Eletrobras hoje é um quarto do preço de mercado. Com privatização, deixaria energia de cotas e passaria ao preço de mercado. Este impacto na tarifa é de, no mínimo, 16%”, afirmou.