Na última sessão plenária do Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 2, o ministro Gilmar Mendes reforçou suas críticas, claras e públicas, aos métodos da operação Lava Jato com base em mensagens divulgadas pelo site The Intercept Brasil. O magistrado leu trechos das conversas dos procuradores e apontou indícios de ilegalidades, visando, sobretudo, desmoralizar e neutralizar a Lava Jato e seus principais integrantes – como o ministro da Justiça, Sergio Moro, e o procurador Deltan Dallagnol –, muito embora os textos divulgados não tenham ainda tido comprovada a sua veracidade. Alguns outros textos foram dados como adulterados por colaboradores da Lava Jato apontados como autores deles.

A enfatizar que as conversas de Telegram – divulgadas pelo The Intercept Brasil e por outros veículos, principalmente pelo jornal “Folha de S. Paulo” – expuseram uma possível proximidade entre Moro e procuradores, a imparcialidade do então juiz e algumas condutas de Dallagnol, chefe da força-tarefa da Lava Jato, foram, sem provas, colocadas em dúvida, inclusive por ministros do STF e por inimigos da operação.

Em julho passado, a Polícia Federal, realizando a operação Spoofing, prendeu quatro suspeitos de hackear contas – o que é crime – do Telegram do ex-juiz Moro e de Dallagnol. Foram encontradas inúmeras mensagens de integrantes da Lava Jato já entregues ao criminoso site The Intercept. Logo depois, foram presos mais dois hackers com fortes suspeitas de invasões e divulgação de mensagens obtidas dessa forma.

No plenário do Supremo, no dia 2, o subprocurador geral Alcides Martins, representante do novo procurador geral, afirmou: “Queria deixar aqui patente a minha preocupação com todas as colocações feitas pelo eminente ministro Gilmar Mendes. Não me cabe fazer nenhum juízo de valor, seja em relação às pessoas, seja em relação às instituições, (aos) atos ou à gravidade deles que foi referida”. Surpreendentemente, ele arrematou: “Se me permite, ministro Gilmar, se pudesse encaminhar esses elementos à Procuradoria Geral da República para que fossem avaliados por quem é de direito porque o que referiu é de extrema gravidade (sic)”.

Anteriormente, o procurador geral havia declarado que, se validadas, as mensagens poderiam dar origem a procedimentos no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), porém sem anular as condenações já impostas. “Se a verdade real é que o réu A, B ou C cometeu crime, o Estado de direito impõe a preservação dessas condenações em função dos julgamentos já operados”. E prosseguira: “Quanto aos agentes que abusaram desses poderes, eles serão objeto de apreciação no CNMP”.

Não há dúvida de que a divergência está em aberto, pois, contrariamente ao procurador geral, muitos juristas defendem o já assentado quanto à validade de provas obtidas por meios ilícitos (hackeamento): elas podem ser usadas para inocentar réus condenados indevidamente, mas não para prejudicar pessoas, no caso, os agentes envolvidos.

Tal divergência é prenúncio do incremento pelo STF da insegurança jurídica já existente. Em suas decisões, o tribunal está dissonante de grande parte da opinião pública, principalmente tratando-se da neutralização da Lava Jato e da acusação de procedimentos irregulares contra o ex-juiz Moro – sumamente respeitado nacional e internacionalmente. Tal insegurança vem influenciando a já difícil e atual governança, prejudicada pela falta de harmonia entre os Poderes, cujas lideranças – acima dos interesses da nação, que passa por grave crise sociopolítica e econômica – buscam protagonismos políticos, pessoais e partidários, além de outros objetivos eivados de viés ideológico.

A não aprovação de imprescindíveis projetos de lei do Executivo – em face de uma oposição cujo prazer é derrotar o presidente –, a desidratação da Previdência, as reformas necessárias não realizadas ou desfiguradas, o amargo déficit fiscal, as falências de Estados e municípios, o amplo desemprego, a violência, o aeroporto bandido de Brasília e o tão próximo fim do ano são fatos que nos mostram que precisamos mudar o caminho até então percorrido. Mudar, e muito.