Marcus Pestana

Marcus Pestana é secretário geral do PSDB e escreve aos sábados em O Tempo

Marcus Pestana

Redes sociais, democracia e a sociedade hiperconectada

Publicado em: Sáb, 10/08/19 - 03h00

Tempos confusos, tempos conturbados, mudança multidimensional e estrutural que se dá em meio à agonia e à incerteza são expressões utilizadas pelo primeiro e talvez maior intérprete da “Sociedade em Rede”, o sociólogo espanhol Manuel Castells, para qualificar os desafios da ruptura de paradigma representada pela revolução produzida pela internet e suas redes sociais.

Como participante de uma geração “pré-internet”, sempre acreditei que democracia era tornar cada vez mais público o que é público e cada vez mais privado o que é da órbita individual. Mas a verdade é que parecemos condenados a viver numa “sociedade BBB”, hiperconectada, exibicionista, transparente além de qualquer limite e com uma concentração absurda de informações e poder nas mãos das grandes plataformas utilizadas. É uma tendência universal e irreversível.

A hiperexposição de tudo e todos tem vantagens e desvantagens. Ainda na era analógica, o grande cronista e teatrólogo Nelson Rodrigues cravou: “Se cada um soubesse o que o outro faz dentro de quatro paredes, ninguém se cumprimentava”. A evolução do mundo moderno foi marcada pelas inovações tecnológicas, que resultaram em saltos qualitativos na forma de produção e convívio social. A internet foi mais uma inovação disruptiva e transformou a vida em suas dimensões econômica, social e política.

A inovação é neutra do ponto de vista moral e ético. O uso e suas consequências dependem de quem a utiliza. A internet pode servir a grandes campanhas humanitárias e à difusão de conhecimento, mas também pode ser instrumento de redes de pedofilia. Há registros de que Santos Dumont e Einstein morreram carregados de tristeza em face do uso, nas duas Grandes Guerras, do avião e da bomba atômica, filha da famosa fórmula deste último.

A internet e as redes sociais propiciaram um enorme aumento da produtividade e de eficiência na economia, mudaram padrões de comportamento e relacionamento entre as pessoas, possibilitando maior aproximação em escala global, e construíram uma poderosa ferramenta para o aprofundamento da democracia participativa, propiciando maior transparência e controle social sobre os processos de decisão.

Mas os efeitos negativos também vieram à tona. Eventos como as interferências no plebiscito do Brexit e na última eleição norte-americana, assim como o vazamento de informações hackeadas de centenas de autoridades brasileiras, colocam uma série de interrogações no horizonte.

Somam-se a isso o uso de dados pessoais e o monitoramento de comportamentos individuais com objetivos mercadológicos, sem a total consciência e controle dos usuários. O vício em redes já começa a ser tratado como doença e como nocivo à saúde.

Não é diferente o mau uso das redes sociais no Brasil, onde a plataforma fantástica de debate democrático transformou-se em ferramenta de fake news, ataques violentos e abjetos a pessoas e desqualificação de instituições fundamentais.

A internet e as redes vieram para ficar. Não se deve jogar fora a criança recém-nascida junto com a água suja do banho. A regulação é extremamente difícil. Os hackers da “Vaza Jato” estavam em Araraquara, mas poderiam estar no Paraguai, em Miami, na Rússia ou na China.

O problema não está na ferramenta, um monumental avanço. Mais uma vez, o centro da transformação está no avanço educacional e cultural dos seus usuários.

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