Diante do grave quadro de polarização exacerbada pelo qual passa o debate político no Brasil, pondero muitas vezes nesse espaço que é preciso cautela na análise das questões nacionais. Assim, raramente uso um tom contundente ao extremo ao abordar temas políticos. É um papel que cada brasileiro deve ter para tentar distensionar o quadro. Nem sempre, porém, a ponderação é possível. Hoje é um desses dias.
É preciso destacar que passou muito do ponto a declaração do presidente Jair Bolsonaro, que ironizou a morte do pai do presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, no período da ditadura. Bolsonaro foi baixo, desumano e irresponsável. Não se colocou à altura do cargo que ocupa, de representante máximo do Brasil. E certamente o presidente responderá por isso no Supremo Tribunal Federal.
Estudos da comissão da Verdade dão conta de que Fernando Santa Cruz foi preso, torturado e morto pelos militares. Nunca houve uma versão oficial e a declaração de Bolsonaro de que ele foi assassinado por grupos de esquerda não tem fundamento fático.
Um documento do Comando Costeiro da Aeronáutica confirma a prisão do então estudante de direito em 1974 no Rio de Janeiro pelo regime militar. Além disso, o ex-delegado Cláudio Guerra disse que ele foi morto na prisão e seu corpo foi incinerado em uma usina em Campos. Os restos mortais nunca foram encontrados. Se Bolsonaro sabe alguma coisa sobre isso, precisa contar com detalhes. Sequestro e ocultação de cadáver são crimes permanentes. Estariam sendo praticados até hoje, não sendo cobertos pela Lei da Anistia.
Mas a questão aí não é apenas legal, mas moral, de convivência humana. Mesmo sendo um adversário, Bolsonaro precisava levar em consideração que Felipe Santa Cruz perdeu o pai aos dois anos. Deve imaginar ser esse o maior drama de sua vida. Não saber que fim levou aquele que o gerou e do qual sequer pode se lembrar não é uma mágoa que se passa como um emprego perdido, uma eleição malsucedida ou um namoro desfeito. É preciso o mínimo de respeito e empatia ao discutir política ou qualquer assunto ou perdermos todos os limites nesse país.
Ouça o comentário do editor de Política Ricardo Corrêa: