Perfil

O novo capítulo da vida do ex-volante Adílson, do Atlético

Nesta entrevista, o integrante da comissão técnica alvinegra fala sobre como está sendo o processo de adequação e também sobre o ano do Galo.

Lohanna Lima| @supernoticiafm
15/12/19 - 05h00

O dia 12 de julho de 2019 ficará eternizado na memória e no coração do ex-volante Adílson. No entanto, a data não marca uma conquista ou algum momento de glória no futebol, mas, sim, o encerramento precoce da carreira aos 32 anos por um problema no coração. Quase seis meses depois, Adílson vem tentando se adaptar às novas funções no Atlético. Em pouco mais de uma semana, Adílson passou de atleta a membro da comissão técnica alvinegra, vivendo de uma só vez muitas novidades e incertezas.

O nascimento da filha caçula, o apoio dos companheiros e a descoberta diária de novas possibilidades no futebol fazem com que o “alemão”, carinhosamente chamado por alguns amigos do futebol, vença a saudade que ainda tem dos gramados. Com tranquilidade na voz e nas expressões, Adílson abriu o coração sobre os próximos planos para a carreira e sobre o desejo de se preparar academicamente para o futuro que o espera do lado de fora dos gramados. Uma coisa, no entanto, ele tem como certa: o coração não permite as emoções de comandar um time à beira do gramado. 

Do dia em que você anunciou a sua aposentadoria até aqui, como vem sendo sua nova vida e, principalmente, sua nova rotina agora como ex-jogador? Realmente, aquele momento de anunciar a aposentadoria foi bem difícil. Sair do campo, jogando, direto para a comissão, foi e vem sendo um processo difícil de lidar. Venho absorvendo muitas informações e aprendendo a me comportar no dia a dia. Quem está na comissão técnica tem que ter uma responsabilidade muito grande sobre o que fala e passa para os atletas. Então, eu procuro aprender de tudo um pouquinho, ouvir bastante e falar muito pouco. Tenho avaliado como vou me sentindo em cada área para depois escolher qual caminho seguir. Fui muito bem recebido por todos e continuo sendo tratado muito bem e com muito respeito. O convite para permanecer foi ótimo porque ao invés de voltar para o Sul e começar a pensar no que fazer, eu já tive uma situação onde eu pude iniciar um trabalho, uma nova ideia e novas perspectivas.

Você consegue detalhar seu trabalho na comissão técnica? Como jogador, você tinha noção de tudo que envolve a preparação para treinos e jogos? O trabalho é muito grande. A gente tem uma noção quando é atleta, só que não participamos tanto, pois nossos horários são mais curtos, ficamos menos tempo no clube e tudo é passado muito mastigado para os jogadores. Então, o jogador chega, executa e vai para casa descansar. Na comissão, é um trabalho que se inicia antes do treinamento. Há toda uma preparação, tem a avaliação dos treinamentos. Iniciei de uma maneira mais próxima do Rodrigo Santana, que na época era o treinador, e participava da preparação dos treinamentos dando opiniões também. Sempre foi perguntado para mim qual seria a visão do atleta em cada situação, em cada decisão que vinha sendo tomada. Falava pouco, mas perguntava e observava bastante. Com a chegada do Mancini, as coisas mudaram um pouco. Fiquei mais afastado do processo de preparação no treino, mas tive mais oportunidades dentro de campo, às vezes fazendo trabalhos específicos com os volantes. Ainda é pouco e sei que preciso de orientação acadêmica para me profissionalizar e desempenhar melhor as funções.

No dia dos jogos, quais são as suas funções? Ainda é difícil assistir às partidas sem poder ajudar dentro de campo? Eu participo com a turma de análise de desempenho. A gente acompanha o jogo de uma cabine especial. Analisamos muito o adversário e se o que treinamos durante a semana está sendo feito em campo. Trocamos muitas informações lá em cima e passamos a mensagem de forma precisa e curta para o banco de reservas para que eles possam repassar aos atletas. Nos primeiros jogos, havia uma questão emocional forte e eu evoluí neste sentido. Tinha dificuldade de analisar o jogo. Hoje, pelo contrário. Eu analiso muito mais o posicionamento e as jogadas do que, de fato, torcendo. É uma experiência única. Talvez, quando eu começar a estudar, eu tenha uma facilidade maior de entender melhor essa parte também.

No último clássico, você estava com a equipe da análise de desempenho na arquibancada e viu de perto a confusão entre as torcidas. Como você se sentiu no meio daquele clima tenso? Nós ficamos um pouco perplexos. A confusão não aconteceu exatamente no nosso local, mas foi perto. Tanto que o gás lacrimogênio chegou até a gente e à imprensa e foi muito desconfortável. Era um dia muito quente e seguimos tentando fazer o nosso trabalho. Na hora de sair também foi um pouco complicado, pois tivemos que esperar as coisas se acalmarem. Infelizmente, essa é uma situação que ainda vem fazendo parte dos jogos, principalmente dos mais importantes. Só uma equipe pode vencer a partida, então imagina se toda vez que uma perder tiver alguma confusão? Espero que as pessoas fiquem mais tranquilas para que esse tipo de cena não se repita.

Quando você informou que teria que se aposentar, muita gente se manifestou demonstrando solidariedade. Você se surpreendeu com a repercussão e recebeu apoio de onde nem esperava? Sim, me surpreendeu porque estava vivendo aquele momento difícil, tentando ainda entender o que estava acontecendo, quando as mensagens começaram a chegar de todos os lados. Estava recebendo muito carinho, muitas pessoas queridas que conheci ao longo dos anos no futebol me ligaram, mandaram mensagens. Muita gente que eu não falava há muito tempo, mas que guardava com carinho, se manifestou. Foi e continua sendo importante, pois ainda acho muito recente e sinto muita falta de jogar. Porém, não tem um dia aqui em Belo Horizonte que eu não cruzo com alguém que me fale uma palavra positiva, que converse comigo ou tenha um simples gesto de carinho. Tem sido legal permanecer em Belo Horizonte e receber esse carinho e incentivo e, por isso, espero poder ficar muito tempo por aqui ainda.

Como o nascimento da sua filha te ajudou nesse processo? Ela veio no exato momento que eu parei, e acredito muito que foi um presente, algo que já estava planejado para que pudesse colaborar com aquele momento difícil que eu estava passando. Desde então, tem sido ótimo o convívio com minha filha em casa, estou realmente muito feliz com a chegada dela, e ajuda a amenizar, claro. No dia dos jogos, nós a vestimos com as roupinhas do Atlético e sabemos que será uma futura torcedora do Galo.

No anúncio da sua aposentadoria, o time veio acompanhar a coletiva e muitos estavam bem abalados. Alguns, como Patric e Victor, choraram durante o seu pronunciamento. Como foi contar para o grupo que você não poderia mais jogar? Em um primeiro momento, o Rodrigo (Santana) e o Lucas (Gonçalves), que eram os comandantes aqui, chamaram só os atletas mais experientes e passaram a notícia pra eles. Foi uma reunião muito particular, tanto que no dia em que voltei ao clube, a maioria não sabia ainda o que estava acontecendo. Então eu vim direto para a coletiva e muitos deles ficaram sabendo na hora também. Victor e Fábio Santos, por exemplo, são amigos que tenho da época de Grêmio, há mais de dez anos. Por isso, eles sentiram um pouco mais devido à proximidade e amizade que temos. Imagino que cada um deles se colocou no meu lugar, tendo que interromper a carreira de repente, e por isso foi difícil para todo mundo. Mas o importante é que seguimos juntos, continuamos dando risadas juntos e muito próximos e esse processo tem me ajudado muito. Continuo à disposição deles e eles sabem que podem contar comigo também.

Você falou bastante sobre estudar. Após esses quase seis meses longe do campo, já conseguiu definir qual caminho seguir? Pensa em faculdade ou algum curso? Já tenho alguns objetivos traçados, algumas ideias. Estou em um processo de transição de jogador para o funcionário da comissão técnica. Ainda não fiz nenhum curso, mas pretendo começar assim que minha situação for definida no clube. Gosto de estudar e de aprender e já pude conversar com muitos profissionais de altíssimo nível que me deram algumas dicas e ideias. Gente que trabalha em uma linha que eu gosto muito. Estou ansioso para que isso se inicie a partir do ano que vem, espero que se concretize o acerto para a permanência no ano que vem e que o Atlético possa ter um ano melhor em 2020 e eu possa fazer parte disso.

Seu contrato com o clube vai até o fim do ano que vem. Vocês conversaram depois da aposentadoria? Existe alguma pendência a ser resolvida para que você permaneça no ano que vem? Naquele primeiro momento, foi difícil falar sobre contrato, pois é a parte mais chata desse processo. O presidente me deixou muito tranquilo desde o momento em que a situação se definiu. Ele me ligou e colocou toda a situação, então estou tranquilo quanto a isso. A gente sabe que certas coisas levam tempo, a parte burocrática no Brasil é sempre muito lenta e difícil, mas isso vai se resolver. Acho que ano que vem tem tudo para ser um ano muito bom e para mim e para o Atlético.

Quando você se aposentou, disse que esperava um título para que pudesse ser campeão mesmo fora dos gramados. Na ocasião, o time estava bem no Brasileiro, ia para o jogo da volta das quartas da Copa do Brasil e tinha a Sul-Americana pela frente. Por que o Atlético não conseguiu conquistar nenhum desses títulos que disputou? A gente sentia que estava muito palpável (um título), principalmente o da Sul Americana. A equipe estava em um momento muito bom, tinha se encaixado e a gente sentia que podia conquistar algo. Eu acreditava porque conhecia muito bem todos eles. Mas o futebol é assim, é muito mais difícil do que parece. E eu tenho certeza que eles fizeram tudo o que era possível. Não consigo definir o momento em que as coisas saíram do trilho. Perdemos a Sul-Americana nos pênaltis, então foi por um pequeno detalhe, na verdade. Começou aquele processo todo de Campeonato Brasileiro, Sul Americana, time sendo poupado, e o resultado é que determina se as escolhas foram certas ou não.

Ser treinador é algo que você vislumbra? Sendo muito sincero, não. Os treinadores ficam muito nervosos à beira do gramado e, como eu já tive esse probleminha, então é melhor não arriscar (risos). Conheço muitos que ficam nervosos demais, que precisam ter cuidado aqui, outro ali com isso. No máximo, acho que posso ser auxiliar em algum momento.

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