Entrevista

Mineirão se reinventa para sobreviver e promete equilíbrio até 2020

Diretor comercial do estádio, Samuel Lloyd, comemora números, explica inadimplência do Estado e destrincha relacionamento com Cruzeiro e Atlético

Mineirão se tornou um dos principais palcos de grandes eventos musicais do Brasil | Foto: Agência i7/Mineirão
Thiago Nogueira e Leandro Cabido| @supernoticiafm
19/01/19 - 06h22

Construído essencialmente para ser o principal palco do futebol mineiro, o Mineirão tem apostado em sua capacidade multiuso para sobreviver. Em 2018, o estádio registrou seu melhor ano de operação desde que foi reaberto, novinho em folha, em 2013. Mas, mesmo festejando os números, a concessionária Minas Arena não consegue dividir os lucros da Parceria Público-Privada (PPP) com o Estado. Ela espera chegar lá até 2020.

Apesar de estar sem receber do Estado as parcelas mensais de pagamento pela reforma, a empresa está bem calçada, e executa as garantias para não ficar sem a grana. Enquanto isso, a administração volta a flertar com o Atlético, na tentativa de convencê-lo a jogar novamente no estádio, e tenta dar ao Cruzeiro, seu fiel parceiro, o melhor tratamento possível. A diretoria celeste quer o estádio só pra ele, algo que não é possível atualmente.

O Super FC conversou com o diretor comercial do Mineirão, Samuel Lloyd. Confira a entrevista:

Como o Mineirão conseguiu fazer com que o ano de 2018 fosse o de melhor operação do estádio até aqui?

Foi um ano de celebrar as conquistas, um ano de muito aprendizado e de aplicar o que foi aprendido em 2017, quando fizemos mais de 40 jogos e 94 eventos, o que já era um marco. Era impossível prever que o Mineirão seria tão abraçado pelo mercado de eventos e faríamos 253 eventos, além de 37 jogos. O Mineirão ocupa um espaço que movimenta a economia criativa da cidade e a agenda de Belo Horizonte.

Por que, mesmo com tantos eventos, a PPP do Mineirão não consegue chegar à sua essência e dividir os lucros com o Estado?

Existia uma expectativa muito inflada pelo momento em que o Brasil vivia naquele momento. Era um país de economia pujante, Copa do Mundo, Olimpíadas. Esperava-se que a margem operacional do estádio fosse na casa dos 45%. Teríamos que custar muito menos do que a gente arrecada hoje. Mas o Mineirão custa mais do que se arrecada. Esse número está cada vez mais se aproximando do equilíbrio. A gente acredita que, neste ano ou, no máximo, em 2020, a gente equilibre essa balança em função do aprendizado. É a única arena do Brasil que tem esse nível de atividade, e isso requer um período de maturação. O próprio contrato de PPP trazia três anos de aprendizagem, e a gente percebeu que esse período era um pouco maior.

O erro foi considerar que o Atlético jogaria no estádio, o que acabou não acontecendo?

Como o plano de negócio da concessão é baseado em todos os jogos de Atlético e Cruzeiro, a expectativa era que isso traria um número maior de patrocinadores, melhores vendas das áreas VIPs e de camarotes. A gente teve que desconstruir esse plano e transformar, de fato, o Mineirão numa arena multiúso, como a gente vê hoje.

Como anda a negociação com o Atlético para trazer mais jogos?

A gente vem acompanhando pela imprensa declarações da diretoria de que há o interesse em trazer alguns jogos para cá. Na nossa análise, o Atlético, quando joga aqui, é superavitário, faturou alguns milhões de reais. Estamos esperançosos, a ideia é chegar a um acordo.

O Estado está inadimplente com as parcelas da PPP, e o dinheiro é tirado de um fundo. Como está a relação com o novo governo Zema?

Fomos muito bem recebidos pela equipe de transição. Eles pegaram todas as informações do Mineirão. O Estado está inadimplente há 26 meses. Entendemos a crise financeira, mas entendemos a importância do Mineirão para a economia da cidade. Dados internos, sem um estudo próprio, dizem que a cada R$ 1 investido pelo Estado na concessão, R$ 10 voltam para a economia do Estado. Trabalhamos para que isso seja bem melhor, devolvendo para os pagadores de impostos este dinheiro investido. Esperamos que o governo seja capaz de equilibrar as finanças, sabendo priorizar os pagamentos. O Mineirão é uma opção gratuita na Esplanada, traz grande eventos e movimenta a economia criativa. Esperamos que seja colocado para a Minas Arena a recomposição do fundo de garantia.

Qual o limite desse fundo?

Para a gente, isso não é muito claro. Quem faz o controle do limite é o próprio governo e o agente de garantia, que é um banco. No mês de novembro, já foi realizado o pagamento de uma das parcelas, o que não necessitou executarmos a garantia. Esperamos que o pagamento seja normalizado. Não existe um prazo de validade (para o fundo). O parceiro privado que administra o estádio está pronto para qualquer dificuldade e manter o Mineirão como protagonista no futebol e no cenário de entretenimento.

O Cruzeiro já manifestou o desejo de que o clube seja, de fato, dono do estádio. Mas, legalmente, hoje, isso não é possível. Algum dia o Cruzeiro pode adquirir o Mineirão?

Temos um contato muito próximo com a diretoria do Cruzeiro, em alguns momentos eles já manifestaram o interesse (de gerir o Mineirão). Na prática, o Cruzeiro já tem autonomia para fazer a administração dos jogos. O que a gente entende é que estamos falando de um estádio público, que pertence ao povo mineiro, a todos os torcedores, não só a um time. Foi feita uma licitação para que a Minas Arena pudesse estar onde ela está hoje. Seguindo a legislação, para que o Cruzeiro pudesse ser um operador do estádio, ele teria que passar por um processo de licitação para, então, ser o operador. No momento em que a Minas Arena se candidatou, era vedado aos clubes participar do processo. Mas isso pode mudar. Nosso contrato termina em 2037 e vira uma chance de tentar esse pleito.

Existe alguma chance de privatização do Mineirão agora, lembrando que o governo Zema é a favor disso?

Qualquer coisa que eu disser é especulação. Acredito que não. O Mineirão é um grande investimento do Estado para movimentar a economia criativa e o esporte na cidade. A gente está acostumado a ter um retorno pífio ou negativo do imposto que a gente paga. Sobre privatizar ou não, cabe ao governo. Nosso contrato é até 2037, acredito que, até lá, isso não aconteça, nada que possa ser conversado entra as partes, mas é algo muito remoto de acontecer nos próximos anos. 

Se o Cruzeiro chegar com um caminhão de dinheiro para comprar o Mineirão, da parte de vocês, vocês vendem?

Não posso falar pelos acionistas. Eu sou da parte executiva. Mas se o Cruzeiro quiser realmente comprar, vai precisar ter a anuência do BNDES, nosso agente de financiamento, do poder público, dono do estádio, e autorização dos acionistas. 

Neste ano, temos a Copa América. Depois da Copa do Mundo e das Olimpíadas, a Copa América fica mais fácil de fazer?

Hoje a nossa operação está muito mais madura. Diferentemente da Copa do Mundo, em que vinha uma equipe da Fifa e operava aquele jogo, na Copa América, a operação é da nossa equipe, que sabe realizar clássicos e grandes finais. É sempre um desafio. Temos que lembrar que estamos recebendo pessoas de outros países e essas pessoas querem ser recebidas de maneira adequada, que estão pagando um ingresso mais caro que um ingresso normal. O nível de exigência aumenta bastante. E estamos prontos para atendê-lo.

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