O diretor-presidente da agência Invest Minas, João Paulo Braga Santos, e a assessora estratégica para Negócios em Turismo, Bárbara Botega, confirmaram nesta terça-feira (28/3) que as negociaçôes para assinatura do contrato entre o Salesianos, proprietário do antigo Colégio Dom Bosco, e a rede Vila Galé, estão adiantadas. A rede pretende implantar no prédio histórico em Cachoeira do Campo, o mais populoso distrito de Ouro Preto, um complexo hoteleiro e a primeira unidade em Minas.
Segundo João Paulo, as conversas já avançaram desde que o CEO da Vila Galé, em sua visita a Minas, em novembro do ano passado, havia adiantado a intenção de construir um empreendimento em Ouro Preto. "Estamos próximos de concretizar", disse. Bárbara Botega, que conduz as negociações, disse que agência de promoção e desenvolvimento tem atuado na atração de negócios ligados ao turismo, identificando oportunidades nos municípios e apresentando ao mercado.
"A Vila Galé em Ouro Preto representa a materialização e sucesso dessas iniciativas e será um catalisador do turismo em Ouro Preto, a partir da integração do patrimônio histórico e cultural com uma infraestrutura hoteleira classe mundial. Irá inclusive incrementar o fluxo turístico e potencializar o desenvolvimento econômico", afirma Bárbara.
Encantado com Ouro Preto
Consultada pela reportagem, a assessoria da rede Vila Galé disse que o acordo ainda não havia sido formalizado. Como adiantou o portal O Tempo no ano passado, o presidente da rede, Jorge Rebelo de Almeida, visitou Minas Gerais para conhecer Ouro Preto e o Instituto Inhotim, em Brumadinho, e não escondeu seu encanto por Ouro Preto.
Jorge Almeida teceu elogios à preservação do casario histórico e se disse muito surpreso com o encontro com Angelo Oswaldo, prefeito da cidade, a quem definiu como "um homem de cultura" e que "cultura e turismo têm de andar de mãos dadas". E ainda emendou: "Uma cidade que não cuida de seu patrimônio histórico é uma cidade sem alma".
O antigo Regimento Regular de Cavalaria de Minas e Colégio Dom Bosco deve sediar o mais novo empreendimento da rede hoteleira Vila Galé em Minas. Ele fica localizado no distrito Cachoeira do Campo, em Ouro Preto.
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DNA histórico-cultural
A rede Vila Galé tem em seu DNA história e cultura. Rebelo não esconde sua paixão por patrimônios históricos. Em 2024, a rede deve abrir um hotel no centro histórico de São Luís. Em 2014, um palacete do século XIX foi transformado em produto de luxo no bairro boêmio da Lapa, o Vila Galé Rio de Janeiro, seguindo a tendência de hotéis portugueses.
Em Portugal, é comum o turista se hospedar em hotéis que foram fortalezas, monastérios e palácios. O próprio Hotel Vila Galé Elvas Spa & Conference é o melhor exemplo. Um antigo convento setencentista, que estava em avançado estágio de degradação na cidade de Elvas, no Alentejo, foi transformado em um hotel de luxo de 79 quartos em 2019.
Em Portugal, a Vila Galé tem 27 hotéis e quatro em prédios históricos, todos da categoria Collection. São eles o Vila Galé Palácio dos Arcos, o Vila Galé Braga, o Vila Galé Elvas e o Vila Galé Alter Real. Em junho, será inaugurado o Vila Galé Collection São Miguel, edifício-sede da Santa Casa da Misericórdia de Ponta Delgada, na ilha de São Miguel, nos Açores.
História de Minas
Para o historiador Alex Bohrer, a edificação é de extrema importância para a história de Minas e, especialmente, para Cachoeira do Campo. Ao saber da notícia, alguns membros da comunidade discordaram da ideia de hotel: gostariam de ver novo local sua finalidade original, um centro educacional ou um quartel da Polícia Militar. Para o prefeito Angelo Oswaldo, no entanto, "não cabe mais, portanto, reivindicar algo que ficou superado por este grato acontecimento".
Cachoeira do Campo foi um arraial ligado à antiga Vila Rica. Como era comum na época, foi escolhida como residência de campo do então governador de Minas, Luís António Furtado de Castro do Rio de Mendonça e Faro, o Visconde de Barbacena, na época da Inconfidência Mineira. Entre 1730 e 1772, foi a residência mais luxuosa de Minas.
Ligado à Inconfidência
A 2 km do Colégio Dom Bosco, o prédio do Palácio dos Governadores é uma edificação que teve grande importância histórica e política na Capitania das MInas Gerais. Foi no local que Joaquim Silverio dos Reis denunciou os inconfidentes, em 1789, colocando fim aos ideais dos membros do movimento, entre Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes. Hoje, o sedia a Escola Estadual Nossa Senhora Auxiliadora.
Já o Colégio Dom Bosco foi tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG) em 3 de dezembro de 2014. A edificação foi construída no século XVIII para abrigar até 1819 o 1º Regimento Regular de Cavalaria de Minas, ou Dragões d'El-Rei, hoje os Dragões da Inconfidência, onde serviu o Alferes Tiradentes.
O dossiê do Iepha-MG descreve o conjunto como "composto por edificação principal, teatro, mausoléu, residência do caseiro, antiga serraria hidráulica, antiga residência de Augusto de Lima Jr, curral, ponte sobre o rio Maracujá e outras estruturas arqueológicas.Do prédio principal original em ruínas foram aproveitadas as estruturas e o restante foi sendo alterado e ampliado conforme as necessidades educativas e as novas experiências de cultivo e produção nas terras".
Quartel e macarrão
"O quartel era estratégico para proteger o governador. Quando fugiu de Portugal, a Coroa Portuguesa trouxe seus cavalos para o local", destaca historiador Alex Bohrer. Esse prédio magnífico que a Vila Galé pretende restaurar para construir seu resort de campo também sediou a Coudelaria Real, centro de criação e aprimoramento de cavalos de raça.
Em 1889, a propriedade deu lugar à colônia agrícola Cesário Alvim. Muitos imigrantes italianos, relata Bohrer, vieram trabalhar na região e abriram uma fábrica de macarrão. "Daí que surgiu o gosto pela macarronada aos domingos", acrescenta. Em 1896, os Salesianos adquiriram a colônia e implantaram as Escolas Dom Bosco, instituição de ensino que funcionou até a década de 90. Seu uso mais recente foi como alojamento de funcionários de uma empresa privada.
Hotel e cachoeira
"Dos anos 90 até 2009, o local foi transformado em hotel e depois tombado pelo Iepha", contextualiza o historiador. Bohrer, que já fez um vídeo sobre o antigo Palácio dos Governadores, prepara-se para produzir um outro contando a história do Dom Bosco. Grande parte do interesse da comunidade em preservar o lugar, destaca ele, está no fato da cachoeira que deu nome ao arraial estar dentro da propriedade.
O bandeirante Fernão Dias Paes foi o primeiro a utilizar as águas no final do século XVII, entre 1674 e 1675, quando descobriu a cascata que dá origem ao nome do arraial. Desde então, a queda d' água é aberta à comunidade. "Eu não conheço a proposta da Vila Galé, mas acho muito importante ouvir o Iepha e a comunidade", salienta o historiador.