A secretária Nacional do Clima, Ana Toni, anunciou nesta quinta-feira (14), em entrevista ao biólogo Thiago Metzker, e o urbanista Sérgio Myssior, observadores internacionais na Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas, a COP 29, que o Brasil vai lançar um grande programa para investir na capacitação de estados e municípios, o Adapta Cidades, e reforçar o Fundo Clima, sob gestão do BNDES, em até R$ 20 bilhões em 2025.
A proposta está sob o guarda-chuva da NDC brasileira - que são os compromissos climáticos assumidos por cada país para reduzir emissões e se adaptar aos impactos já sentidos pelas mudanças do clima. O documento brasileiro foi entregue ao secretário Geral da ONU, António Guterres, na quarta-feira (13), pelo chefe da delegação nacional, o vice-presidente Geraldo Alckmin, em Baku, Azerbaijão, onde lideranças de cerca de 200 países estão reunidas com o objetivo de se desenhar um acordo global sobre como mitigar e adaptar as nações frente às consequências das mudanças climáticas.
Metzker enfatizou com Ana Toni a importância de fortalecer os processos de adaptação para os grupos mais vulneráveis, como o acesso a recursos de financiamento climático, e a secretária afirmou que esta foi a primeira vez que o Brasil apresentou um compromisso internacional, colocando a adaptação no centro.
“O Brasil é um país muito vulnerável. Esta novidade que conseguimos emplacar já é um reflexo do que está ocorrendo no cenário dos desastres climáticos em estados e municípios brasileiros, a exemplo do que vimos nas tragédias no Rio Grande do Sul, a seca na Amazônia e os incêndios pelo país”, disse a secretária.
Sobre como acessar recursos financeiros, Ana Toni ressaltou que, para conseguir ajudar estados, municípios e o setor privado a investirem nesta adaptação, o governo está avançando em duas frentes. “Estamos criando as condições de capacitação que muitos estados e municípios não têm, e mesmo que queiram, não têm estrutura para fazer projetos e conseguir financiamento. Estamos lançando então, este grande programa, que é o Adapta Cidades, para trabalhar com estados e municípios, e fortalecermos essa capacidade de ter projetos consistentes”, comentou.
O programa desenhou capacitação técnica para 200 municípios, mas já aumentou para 450, dentro de um cenário de 5.570 cidades brasileiras. “Esta iniciativa vai conseguir recursos internacionais e, com mais pessoas trabalhando, vamos avançar na capacitação de mais cidades”, acrescentou.
Para Metzker e Myssior, sócios no Grupo MYR, empresa que desenvolve projetos ESG para empresas públicas e privadas, é nítida a necessidade de capacitação de municípios no desenvolvimento e modelagem dos projetos. “Essa orientação aumenta, em muito, a assertividade para a captação de recursos e viabilização dos projetos. Muitas vezes, os recursos estão disponíveis, mas faltam projetos bem estruturados para que as cidades consigam captá-los”, avalia a dupla.
FUNDO CLIMA TERÁ MAIS R$ 10 BILHÕES
A outra frente de aposta do governo federal, segundo Ana Toni, é o incremento do Fundo Clima, já em vigor e gerido pelo BNDES. “O fundo era de R$300 milhões, agora tem R$10,4 bilhões e vai crescer para R$20 bilhões ano que vem, para financiar tanto ações de mitigação quanto de adaptação. Percebemos este ano que um dos grandes gargalos para estados e municípios é realmente trazer projetos, pois não tivemos tantas propostas para adaptação”, informou.
Segundo a secretária Nacional do Clima, o país colocou a justiça climática como pilar nesta NDC. “Sabemos que, num país ou em uma cidade, as pessoas que mais sofrem com os efeitos das mudanças climáticas são os mais vulnerabilizados, e o governo está com olhar atento sobre como ajudar”, conclui.
PREFEITO AFIRMA QUE CIDADE FAZ O DEVER DE CASA NA PAUTA DO FEDERALISMO CLIMÁTICO
Voz considerada referência em relação à movimentação cada vez mais relevante dos governos subnacionais na pauta ambiental, o prefeito Axel Grael, de Niterói (RJ), marcou presença na agenda da COP 29 desta quinta, 14, e conversou com o urbanista Sérgio Myssior, no Azerbaijão, destacando expectativas, ambições e o plano de ação climática da cidade.
“Precisamos que Baku dê certo e apostamos no novo conceito apresentado aqui pelo Brasil, o federalismo climático”, declara o prefeito. “Niterói é um exemplo de proatividade na Agenda ESG e se tornou a primeira cidade do país a implantar uma secretaria do clima”, ressalta Grael.
“Avançamos na estruturação das políticas de governança e resiliência, investimos na contenção de encostas e drenagem, além de contarmos com a estrutura de uma defesa civil que desponta entre as melhores do Brasil”, celebra o prefeito. “Fizemos o nosso dever de casa, com um plano de ação climática local, mas ambicionamos o comprometimento de toda a nação, afinal, só alcançaremos os resultados com o protagonismo dos governos locais”, conclui.
Especialista em ESG e um dos observadores internacionais selecionados pela ONU para a Conferência das Partes sobre as Mudanças Climáticas, Myssior acredita que Niterói inspira outros municípios, atuando de forma transversal, tanto na formulação quanto na implantação de políticas públicas no curto, médio e longo prazos, viabilizando soluções de adaptação das cidades ao novo cenário das mudanças climáticas.
“Niterói é uma referência em iniciativas ESG, notadamente em relação aos municípios, que vêm enfrentando dificuldades resultantes das mudanças climáticas, principalmente nesse período chuvoso, como inundações e deslizamentos de Terra”, afirma Myssior, apontando a Lagoa de Piratininga, com o jardim filtrante, como um dos exemplos da atuação relevante da cidade.
“COMPROMISSO CONJUNTO ENTRE UNIÃO, ESTADOS E MUNICÍPIOS”, DIZ REPRESENTANTE DA FRENTE NACIONAL DE MUNICÍPIOS
Em conversa com o Coordenador de Relações Institucionais e Projetos · Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP), Daniel Miranda, o urbanista e sócio do Grupo MYR - Soluções em ESG, Sérgio Myssior, observador internacional da ONU na COP 29, contextualizou a entrega oficial do Brasil na conferência climática das suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, na sigla em inglês), que representam o compromisso do país com um corte efetivo de emissões de gases de efeito estufa da ordem de 59% a 67% até 2035.
E questionou Miranda sobre a avaliação dele acerca da série de ações inseridas no documento como compromisso de adaptação, principalmente dos territórios municipais ao novo cenário de mudanças climáticas.
Para Miranda, as NDCs apresentadas pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSD), foram recebidas com muita alegria. Segundo ele, “não apenas pela ousadia que a nova NDC traz, mas pelo compromisso com o federalismo climático, ou seja, o compromisso para que as políticas públicas de combate às mudanças climáticas sejam feitas em conjunto entre União, estados e municípios”.
“Dessa forma, todos sentam à mesa e podem discutir tanto suas realidades locais, quanto os parâmetros e as determinações locais para definir os melhores caminhos de combate às mudanças do clima. Tudo isso está alinhado ao tema principal desta COP, que é um financiamento climático para fazer com que os fluxos financeiros sejam aumentados, especialmente no âmbito nacional e cheguem aos municípios”, enfatizou.
JOVENS BRASILEIROS PROTAGONIZAM ESPAÇO EM BAKU DE OLHO NA COP 30, NO BRASIL
Sérgio Myssior, do Grupo MYR e observador internacional na COP 29, entrevistou a ativista Carolina Dias, do movimento juvenil Engajamundo
Que movimento é o Engajamundo e qual seu propósito?
Estamos aqui na COP 29 com a associação de jovens Engajamundo, com uma delegação de 14 jovens. O Engaja atua no Brasil todo falando sobre mudanças climáticas, gênero e biodiversidade, e a importância de discutirmos dentro dos territórios a inclusão dos jovens. Principalmente nossa participação dentro dos espaços de tomada de decisão de modo geral e nossa inclusão na política.
Qual o papel da juventude nas questões relacionadas à adaptação dos territórios ao cenário da emergência climática?
O engajamento dos jovens está presente na conferência há mais de uma década, a gente sempre vem com os times de comunicação, ativismo e advocacy. E como advocacy, estamos acompanhando as negociações - tanto de adaptação, quanto da contribuição nacionalmente determinada do Brasil, a NDC (apresentada na quarta-feira, 13/11, pelo chefe da Delegação brasileira na COP, o vice-presidente Geraldo Alckmin). A gente quer ver uma meta ambiciosa, que possa marcar uma transição energética justa e uma transição da economia para de fato um modelo que possa lidar com a necessidade de financiamento que os territórios têm.
O que vocês esperam desta conferência?
Acompanhamos a COP também como sociedade civil, pensando em como garantir a transparência desses processos. Isso passa por mecanismos para a inclusão, como a facilitação do idioma - a tradução para o português - e para a COP 30 (a ser realizada em 2025, em Belém (PA), a gente estabeleceu um precedente de traduzir o evento para as línguas indígenas, ampliando a capacidade de todos estarem inseridos nesse espaço. Essa é a nossa grande expectativa dessa COP: ver mais ambição e a gente poder fazer nesse precedente de caminho uma articulação que vai estabelecer espaços mais democráticos dentro das COPs.
*Correspondentes especias de O TEMPO na COP29