James David Vance, mais conhecido como “JD Vance”, tem 39 anos e o perfil do americano branco, de classe média, que empobreceu nos últimos anos devido à ausência de políticas públicas substanciais para essa fatia da população. Patriota, ele atuou na guerra contra o Iraque e, ao retornar, cursou ciência política, além de direito. “Suas múltiplas vivências constituíram um pensamento crítico sobre a realidade dos americanos, de modo que lançou o livro best-seller ‘Hillbilly Elegy’ (em tradução livre para o português, ‘Elegia Caipira’), transformado no filme ‘Era uma Vez um Sonho’ (2020), que o fez ter visibilidade midiática enquanto comentarista político”, afirma a doutora em ciências sociais com ênfase em política na PUC-SP Juliana Fratini.
Devido à sua leitura precisa sobre os anseios da população norte-americana branca, Vance foi convidado a integrar o núcleo partidário republicano, o que modulou o seu comportamento enquanto liderança política conservadora, complementa Juliana.
É com esse histórico que o senador pelo Estado de Ohio chega à corrida eleitoral de 2024, escolhido por Donald Trump como seu vice. A trajetória pessoal de Vance é marcada por uma história de superação, o que reforça sua imagem de “self-made man” – o americano que, apesar dos desafios, alcança o sucesso, afirma a cientista política e professora do curso de relações internacionais da ESPM Denilde Holzhacker.
“Vance foi criado em uma família com dificuldades. Sua mãe enfrentou dependência de drogas e remédios, mas conseguiu se reabilitar. Ele narra essa história em seu livro, trazendo para sua campanha um apelo de autenticidade e identificação com milhões de americanos. Além disso, sua formação acadêmica e profissional, conseguindo superar as adversidades e se tornar próspero, reforça ainda mais essa narrativa”, diz.
Para o pesquisador do Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da FGV Leonardo Paz, Vance transmite a figura clássica do americano: “se você se esforçar, se você fizer, você consegue!”.
Outro ponto importante, conforme Denilde, é que Vance é casado com uma mulher de origem indiana, o que amplia seu apelo a eleitores com laços migratórios. “Dessa forma, sua figura é estrategicamente moldada para conectar-se a diferentes segmentos da sociedade americana – desde a classe operária branca e até minorias e imigrantes –, tornando-o um ativo importante para o Trump”, afirma a professora.
Sua postura populista e suas raízes na classe operária fizeram dele uma escolha estratégica para Trump, buscando atrair eleitores desiludidos com a economia e o governo atual. Desde o início da campanha, Vance tem sido uma figura central, ecoando as mensagens de Trump. Ele participa ativamente de comícios, oferecendo uma retórica combativa contra a administração do atual presidente, Joe Biden, e focando as questões econômicas, como a inflação e a perda de empregos no setor industrial.
Para a cientista política e professora da ESPM, Vance tem sido bastante estratégico em suas posições políticas, posicionando-se claramente como uma liderança em ascensão dentro do Partido Republicano. “Ele entende que Donald Trump, caso seja eleito, estará em seu último mandato, o que abre espaço para uma nova geração de líderes republicanos. Vance tem trabalhado para se consolidar como um possível sucessor. A grande questão para Vance será como ele conseguirá capitalizar esse momento após a eleição de 2024, seja com uma vitória, seja com uma derrota”, analisa.
De ferrenho opositor a fervoroso apoiador de Donald Trump
“Após longa deliberação e reflexão, e considerando os enormes talentos de muitos outros, decidi que a pessoa mais adequada para assumir o cargo de vice-presidente dos Estados Unidos é o senador JD Vance”, escreveu Trump no dia 15 de julho ao anunciar o nome do senador de Ohio, na sua plataforma Truth Social, como o candidato a vice do Partido Republicano para as eleições presidenciais de 5 de novembro.
Mas nem sempre foi assim. Vance era um ferrenho crítico de Trump. Em 2016, ano em que o magnata republicano concorreu e venceu as eleições presidenciais, Vance o chamou de “idiota”, “nocivo” e o “Hitler da América”. Seis anos depois, Vance mudou de tom ao se preparar para concorrer ao Senado, em 2022, apagando tweets polêmicos e dando crédito a Trump pelo trabalho que havia feito no cargo. O senador, então, entrou no Congresso americano com a ajuda de Trump, cujo endosso o ajudou a vencer uma disputada corrida, e agora é um dos aliados mais leais do ex-presidente. A transformação de Vance fez democratas e até republicanos questionarem se o senador seria um oportunista.
No entanto, durante a corrida eleitoral, o papel de Vance se mostrou central na campanha de Trump. “Vance evita se distanciar do estilo de Trump, o que cria uma impressão de que ambos são quase uma extensão um do outro. Essa conexão sugere que Vance está conscientemente seguindo a trilha aberta por Trump”, analisa a cientista política Denilde Holzhacker.
Declarações polêmicas durante a campanha pressionam vice
Durante a corrida eleitoral, o senador JD Vance foi alvo de críticas feitas por celebridades, políticos democratas e até fãs da cantora Taylor Swift, após uma entrevista concedida por ele em 2021 voltar a viralizar. Na ocasião, ao falar num programa de televisão, Vance descreveu os EUA como um país que sofria nas mãos de “mulheres amarguradas que têm gatos em vez de filhos”. A repercussão ocorre em meio a uma eleição na qual o voto feminino pode ser crucial.
Vance também já disse que massacres em escolas são “fatos da vida” e admitiu “criar histórias” ao comentar fake news anti-imigração. No entanto, para a doutora em ciências sociais Juliana Fratini, esse tipo de declaração “não faz a menor diferença para o público com o qual ele dialoga”.