Em uma decisão histórica por 6 votos a 3, a Suprema Corte dos Estados Unidos confirmou a constitucionalidade da lei do Texas que exige verificação de idade para acesso a sites com conteúdo pornográfico. A decisão foi divulgada na última sexta-feira (27) e pode ter impactos profundos sobre privacidade digital, liberdade de expressão e regulação da internet.
O que diz a lei aprovada
Conhecida como HB1181, a lei texana obriga sites com mais de um terço de conteúdo sexual a implementar sistemas robustos de verificação de idade, sob pena de multa de até US$ 10 mil por dia, podendo chegar a US$ 250 mil em casos graves. A norma também exige que os sites exibam mensagens sobre os supostos riscos do consumo de pornografia, medida duramente criticada por especialistas e entidades civis.
Suprema Corte dividida
Segundo o voto da maioria, redigido pelo juiz Clarence Thomas, a exigência de comprovação de idade não viola a Primeira Emenda porque não impede adultos de acessarem o conteúdo, apenas solicita um comprovante de idade. “Adultos não têm direito constitucional de evitar verificação de idade”, escreveu Thomas.
Já na dissidência, a juíza Elena Kagan alertou que a medida impõe um “fardo inconstitucional sobre o acesso de adultos a conteúdo protegido pela liberdade de expressão”. Segundo ela, o Estado estaria, na prática, cerceando direitos garantidos pela Constituição.
Sites bloqueando acesso e debates sobre privacidade
Diante da onda de legislações estaduais similares, a controladora do Pornhub, Aylo Holdings, já bloqueou o acesso ao site em 17 estados norte-americanos. A empresa argumenta que os sistemas de verificação propostos são ineficazes, facilmente burláveis com VPNs, e ameaçam a privacidade dos usuários.
Como mostrou a revista WIRED, especialistas em direitos digitais alertam para os riscos de coleta de dados sensíveis, especialmente em caso de vazamentos ou uso indevido por empresas terceirizadas.
Verificação de idade: biometria, bancos e governo
Entre os métodos considerados estão: escaneamento facial, verificação com documentos oficiais e até dados bancários. Segundo a Free Speech Coalition, grupo que representa a indústria do entretenimento adulto, mais da metade dos estados dos EUA já tentaram legislar nesse sentido desde 2023.
A prática vem se tornando global. França, Reino Unido, Alemanha e Austrália já testam ou implementam sistemas similares. Empresas como Meta e Discord também estão adotando reconhecimento facial como critério etário, segundo reportagem da Wired.
Críticas e riscos à liberdade na internet
Segundo a professora Jess Miers, da Universidade de Akron, entrevistada pela WIRED, "a regulação da pornografia online é, muitas vezes, a porta de entrada para censura mais ampla". Ela alerta que a definição de “material nocivo a menores” pode ser estendida futuramente a conteúdos sobre saúde sexual, diversidade de gênero, educação antirracista e temas LGBTQIA+.
A preocupação cresce com projetos como o Interstate Obscenity Definition Act, proposto pelo senador Mike Lee, e com o plano Project 2025 da Heritage Foundation, que sugere criminalizar a produção e distribuição de pornografia nos Estados Unidos.
O futuro da internet pode mudar radicalmente
Com a decisão da Suprema Corte, o caminho está aberto para que outros estados adotem legislações semelhantes. Para organizações de liberdade civil, a tendência pode transformar radicalmente a internet como conhecemos, impondo barreiras ao acesso de conteúdo legal, aumentando a vigilância digital e potencialmente criminalizando comportamentos privados.
Enquanto isso, gigantes como Google e Apple se recusam a assumir o papel de verificar a idade dos usuários, empurrando a responsabilidade para os próprios sites. A tensão entre privacidade, segurança e censura tende a crescer, e os próximos meses serão decisivos para definir os limites da liberdade digital nos Estados Unidos.