A Copa do Mundo nunca esteve tão distante, apesar de começar amanhã. Nem faz muito tempo, com dois ou três meses de antecedência, as pessoas já estavam pintando as ruas e muros com as cores da seleção, esticando bandeirinhas de um poste a outro, enfeitando suas janelas, no Prado, no Santa Tereza, no Jardim América, no Santo Antônio, na Cidade Nova, no Gutierrez. Na minha memória, isso foi praticamente ontem. E, por falar em ontem, não posso deixar de ver, amanhã, sem falta, aquele acerto com o Marcelo. Se eu tivesse um comércio de toldos, tendas, gazebos e ombrelones, ele se chamaria “O Toldo Poderoso”, com um slogan forte, que poderia ser “Só ele controla as tempestades”.
É esse tipo de coisa, não raro idiota, que invariavelmente me invade a cabeça nessas situações. Aliás, as coisas idiotas são uma fuga dos problemas, porque, claro, ficar pensando neles só faz aumentar a ruminação cerebral. Não sei se me viro para o lado e pego o celular sobre o criado-mudo para ver as horas. Sempre acontece, fico incitado num grau incontrolável a ver as horas, com uma esperança minúscula de que ainda não seja muito tarde e a quase certeza de que a madrugada já vai longe, o que me tira de vez a perspectiva de ainda ter algumas horinhas de sono antes que o dia amanheça. Fico alerta com a iminência. São 2h, tenho até as 7h30, então ainda dá para tentar dormir. É tudo uma questão de olhos fechados, aconchego e mente vazia.
Eu podia tanto conseguir ir à festa junina no sítio da Fernanda no próximo fim de semana, mas, atribulado do jeito que vou estar, acho complicado. Se eu conseguisse desenrolar algumas questões na sexta-feira, talvez desse jeito. Gente, e por falar em Fernanda, não é que a Renata tem razão?Aquele cenário de crise, falta de combustível e ameaça de desabastecimento, o que efetivamente começou a acontecer, poderia ter evoluído para a desolação que o Kapuscinski registra da guerra civil angolana no “Mais um Dia de Vida”. Sede. Não está dando certo. Preciso pensar em nada. Sede e vontade de ir ao banheiro.
Normalmente, sei que vou ter insônia num prazo de, no máximo, meia hora depois que me deito. Se, nesse tempo, o sono não veio, é como se a cabeça, a minha revelia, se programasse para ele não vir mais. É uma programação que atinge o corpo. Começo a sentir uns espasmos, como pequenas correntes elétricas que percorrem dos pés à cabeça e que parecem nascer do peito, um pequeno tremor, quase imperceptível, mas definidor de que passarei mais uma noite em claro. Vou ao banheiro e vou beber água.
Também não estou muito empolgado com a Copa do Mundo, mas acho que, começando, pode ser que isso mude. Sei lá, os amigos chamam para ver jogo junto, tomar uma cerveja. Mas eu estou tão sem tempo que, não sei, se eu conseguir acompanhar uns dois ou três jogos já será lucro. Essas crises acontecem de repente, sem aviso. Digo crise porque o mais comum é que a uma noite de insônia se sucedam várias outras. Isso vai minando a sanidade e a saúde, e em algumas situações não há nada o que eu possa fazer. Não vou tomar aqueles barbitúricos que mataram o Elvis. Já são quase 4h, talvez seja melhor pegar o Kapuscinski e sentar no sofá da sala. É um pouco menos desesperador do que ver o quarto clareando aos poucos pelas frestas da cortina. Drácula feelings.