Ulysses Guimarães, meses antes de desaparecer nas águas de Angra dos Reis, no dia 12 de outubro de 1992, aniversário de 500 anos do descobrimento da América, disse: “Esta legislatura (conjunto de deputados e senadores recém-eleitos para um mandato de quatro anos) é pior que a última, mas certamente é melhor que a próxima”.
Com uma dezena de mandatos parlamentares, o ex-presidente da Câmara e do MDB, com seus 76 anos, sinalizava aos recém-chegados à Casa, como eu era em 1991, que existe uma tendência natural ao empobrecimento qualitativo da representação popular exercida pelo voto direto.
Os motivos, que não agradam aos ouvidos dos democráticos, são vários. Partindo dos conceitos platônicos de democracia, quem menos conhece, menores possibilidades possui de distinguir o que é melhor para ele em sentido mais amplo. Vota naquele que mais lhe agrada sensorialmente ou fisiologicamente. Entre tantos pode escolher o mais belo, o mais próximo, o mais rico, o mais pobre, aquele que evoca uma lembrança prazerosa, muitas vezes sexual, o que acena saciar o maior dos seus problemas, como a fome, o emprego, o ensino para os filhos, a isenção de um imposto etc.
Tudo isso não quer dizer que o escolhido seja o melhor para governar, ou que saiba distinguir o joio do trigo, o bem do mal, ainda que se apresente como mais útil para a pátria.
Assim como é o eleitor, também o votado não leva a sério o compromisso. Age eleitoralmente e, depois, em desacordo. Muda de tendência e esquece os compromissos que o fizeram chegar ao cargo.
Passa em primeiro lugar a se aproveitar do poder recebido para satisfazer seus interesses. Associa-se em alguns casos a quem derrotou, e, dessa forma, o eleitor que não queria no poder certa pessoa ou certo partido tem que engolir o estelionato. Gatos por lebres são comuns na democracia.
Eleito pela opinião irrefletida do senso comum, e não por um pensamento mais elevado e pelo amor ao bem da pátria, o vitorioso toma rumos próprios.
Costuma votar o aumento do seu próprio salário ou de quem a ele está costurado por interesse, adotando critérios largos e duvidosos, ao mesmo tempo em que os dos barnabés ficam congelados. Defende-se o interesse de um em detrimento de outro, não se importando com as consequências que se difundem. Chega-se a dar vantagem para uma categoria e quebrar o Estado inteiro.
Isso acontece aqui, em Minas, que enfrenta a mais constrangedora situação de contas públicas, aniquiladas pelo descompromisso em limitar vantagens localizadas apesar de facilmente previsível o risco de “venezuelizar” o Estado.
As reformas eleitorais aprovadas pelo Congresso Nacional são imprevisíveis, mas todas sempre geraram vantagens indiretas e facilidades para quem tem mandato. Esse fator provoca, como afirmava Ulysses Guimarães, uma piora dos representantes.
No final de 2017 se introduziu nas regras do pleito o Fundo Eleitoral, ou seja, R$ 1,7 bilhão, que, com o Fundo Partidário de R$ 888 milhões, deu aos partidos recursos de R$ 2,5 bilhões para financiar as campanhas eleitorais. O que aconteceu na realidade é um mundo de recursos públicos, num país quebrado, para presidentes e cacifes de partidos inúteis para custear suas campanhas.
Esse grande esforço contributivo da população, que enfrenta serviços públicos deploráveis, não serviu a outra coisa senão gerar um mercado paralelo de lavagem de recursos e enormes vantagens para “velhas” raposas.
Como se não bastasse, quem se elegeu presidente foi um candidato que optou por não usar o fundo, e quem ganhou para governador em Minas, da mesma forma.
O resultado desmente na prática a necessidade de Fundo Eleitoral. Revogá-lo seria economizar recursos preciosos. A democracia mais recente se manifesta sem fundo.