Cristovam Buarque

Cristovam Buarque

Cristovam Buarque é professor Emérito da UnB e membro da Comissão Internacional da Unesco para o Futuro da Educação

EDITORIAL

Barrar o antissemitismo

Usar a inteligência para vencer o terrorismo

Por Cristovam Buarque
Publicado em 24 de maio de 2024 | 07:17
 
 
 

Em 1961, o serviço secreto de Israel descobriu a presença de Adolf Eichmann em Buenos Aires. Era a chance de vingar o assassinato de 6 milhões de judeus sob a coordenação daquele monstro. Em vez de bombardear o bairro onde ele morava para assassiná-lo, o primeiro-ministro Ben-Gurion optou por capturá-lo, tirá-lo da Argentina, fazer julgamento público, condená-lo à morte e enforcá-lo. Foi um grande risco, mas Israel saiu fortalecido moralmente, seus serviços de informação, respeitados, o sionismo cresceu, e o antissemitismo diminuiu.

Seis décadas depois, terroristas palestinos assassinaram e sequestraram brutalmente 1.500 israelenses. Sob pretexto de eliminar terroristas que se escondiam entre civis, o primeiro-ministro Netanyahu promoveu a destruição de Gaza, assassinando dezenas de milhares de homens, mulheres e crianças e transformando cidades em guetos com 2 milhões de sobreviventes. Aproveitou a ira do povo israelense para esconder falhas de segurança de seu governo e driblar acusações de corrupção contra ele.

Os radicais se matam por uma mesma causa: destruir os sonhos dos moderados. Os mortos e a destruição em Gaza são as vítimas visíveis e imediatas da aliança entre o governo Netanyahu e os terroristas do Hamas, cada um buscando a “solução final” contra o outro: o primeiro querendo expulsar e subjugar os palestinos, os outros querendo anular a existência e expulsar os israelenses. Essa aliança maldita mostra que, no lugar da força moral e política de seus fundadores, Israel terá de usar cada vez mais armas de destruição em massa e implantar apartheid.

Uma vítima invisível e de longo prazo será o desgaste da empatia mundial por Israel e o crescimento do antissemitismo. No dia 7 de outubro de 2023, o mundo acordou ainda mais solidário com Israel, mas o apoio se esvaneceu diante da brutalidade cometida por suas forças armadas contra o povo palestino e da incompetência desse poder militar para derrotar o terrorismo. A solidariedade com as vítimas israelenses se transformou em manifestações de simpatia por Gaza ao redor do mundo, nas ruas e nas universidades.

Os humanistas sabem da contribuição de judeus ao pensamento mundial, admiram a construção de Israel por líderes socialistas que priorizaram educação, ciência e tecnologia. Mas humanismo é incompatível com terrorismo e antissemitismo. Apoiar luta contra o terror e barrar o antissemitismo é tarefa de todo humanista. Para tanto, os humanistas precisam defender o uso da inteligência para vencer ameaças terroristas, mas sem conivência com a “solução final” de expulsar e matar os palestinos.

Precisam se distanciar da estratégia que ao mesmo tempo vitimiza o povo palestino, impõe um holocausto à alma judaica e, em consequência, insufla o antissemitismo.

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