É impossível não notar que a população do planeta tem sofrido com os impactos das mudanças climáticas, e, por mais que tantas catástrofes possam parecer atingir as pessoas de forma igual, isso não é verdade. Há muitos anos, existe uma triste realidade chamada “racismo ambiental”.

O conceito surgiu nos anos 1980, nos Estados Unidos, elaborado por ativistas e acadêmicos que identificaram uma relação entre a localização de comunidades vulneráveis – especialmente as compostas de pessoas negras, indígenas e de baixa renda – e a proximidade a áreas degradadas ambientalmente, como aterros sanitários, indústrias poluentes e locais de disposição de resíduos tóxicos.

Embora seja um termo relativamente novo, as práticas e políticas que resultam em racismo ambiental estão enraizadas em uma longa história de desigualdade social e racial.

O acesso desproporcional a recursos básicos, como saneamento para ter água potável, sistema de esgoto, coleta e destinação adequada do lixo, limpeza urbana e drenagem da água das chuvas – o mínimo de dignidade para viver –, é uma forma perversa de discriminação que afeta, de maneira desumana, comunidades negras e outros grupos socialmente vulneráveis. 
Isso acontece não somente pela falta de recursos dessas pessoas e de investimentos do poder público, mas também pelo excesso de atividades poluentes e degradantes em áreas habitadas por essas populações, resultando em impactos severos sobre a saúde e a qualidade de vida. Esses efeitos vão além do ambiental, afetando aspectos socioeconômicos e perpetuando um ciclo de pobreza e exclusão.

A contaminação da água e do solo é uma das preocupações críticas, pois, em regiões próximas de aterros sanitários, fábricas ou locais sem pavimentação, é comum encontrar níveis elevados de metais pesados, pesticidas e outras toxinas na água consumida. Isso resulta em uma série de problemas de saúde para as pessoas de baixa renda que residem ali, incluindo doenças gastrointestinais, problemas neurológicos e complicações no desenvolvimento infantil.

Quando há fortes chuvas, como aquelas que temos presenciado nos últimos meses, a situação se transforma em calamidade pública, o que contribui diretamente para a redução da qualidade e expectativa de vida dessas pessoas.

Diante desse cenário, é fundamental considerar, além do papel do poder público, a atuação do setor privado. Os governos, em todos os níveis, têm a responsabilidade de formular e implementar políticas públicas que garantam a justiça ambiental e que todas as comunidades tenham o direito a um ambiente saudável. Isso inclui a regulação rigorosa de atividades poluentes, o zoneamento urbano justo e a inclusão das comunidades afetadas nos processos decisivos.

Vejo que os impactos sobre as comunidades negras e vulneráveis, especialmente sobre as mulheres negras, são inegáveis e representam uma grave violação dos direitos humanos.

A luta contra o racismo ambiental é, essencialmente, uma luta pela dignidade e pelo direito de todos a uma vida digna e com menos efeitos das mudanças climáticas. Enfrentar esse desafio requer um compromisso robusto dos governos para formular e implementar políticas públicas inclusivas e eficazes, além da responsabilidade das empresas de adotar práticas sustentáveis e justas. 

Somente com a colaboração entre governos, empresas e sociedade civil, poderemos erradicar as injustiças ambientais e construir um futuro em que todos possam viver com segurança, dignidade e bem-estar.

(*) Fernando Beltrame é mestre pela USP, engenheiro pela Unicamp e CEO da Eccaplan