ACÍLIO LARA RESENDE

Saio das eleições de domingo como se tivesse levado uma surra

O sucesso do presidente eleito depende de pacificar o país


Publicado em 01 de novembro de 2018 | 03:00
 
 
 
normal

Saio das eleições do último domingo como se tivesse levado uma surra. Que começou no primeiro turno. O equilíbrio do centro desapareceu, e a radicalização só me trouxe sofrimento. Os dois candidatos mais rejeitados conseguiram chegar ao segundo turno. Por outro lado, mais de 43 milhões de brasileiros não compareceram às urnas, votaram em branco ou anularam o voto. Mas a melancolia, leitor, que quase me abateu, tem outras causas. Uma delas está na senectude, que às vezes desperta inevitável (e às vezes doloroso) acerto de contas. Pertenço a uma geração que viveu muitas crises ao longo dos anos, mas que também conheceu, na vida pública, exemplos realmente admiráveis.

Um importante alerta: os eleitores que elegeram Jair Bolsonaro não podem permitir que o populismo da esquerda, que quase acabou com o país, seja trocado pelo populismo da direita, que é irmão gêmeo do primeiro. Contra isso, farei o que posso: rezar, rezar e rezar…

A democracia tem a chance de melhorar. Políticos, jornalistas e publicitários terão que se reciclar. A revolução tecnológica trouxe o cidadão comum para dentro do ringue eleitoral. Enfim: os meios para ganhar eleição têm que ser revistos. Tudo será difícil daqui para a frente. A reforma política, que sempre foi a mais importante, agora é inadiável. Há “políticos” que foram justiçados. Há, porém, os injustiçados. Estes foram pegos pelo imprevisível tsunami que desabou sobre o país.

Volto ao risco do populismo da direita, outro caminho seguro para o autoritarismo. O recente espetáculo eleitoral, belo por sua própria natureza, poderá terminar feio. Basta que Jair Bolsonaro não consiga vestir a casaca de presidente e continue a dizer o que sempre disse como oficial de artilharia e/ou como parlamentar por 28 anos.

É tudo muito curioso. Se não houvesse a fatídica facada em Juiz de Fora, o resultado das eleições talvez fosse outro. Quando poderia exibir suas qualidades, mas igualmente seus defeitos, o cruel atentado transformou o capitão da reserva em mito, enquanto, de fato, grande parte de seus eleitores apenas buscava alguém que fosse contra o PT. Ou contra o sistema, que teve no PT seu incentivador. O PT traiu a si próprio. Insistiu na tese de que é o único detentor da verdade histórica.

Jair Bolsonaro, ironicamente, talvez conscientemente, adotou na campanha o repto do ex-presidente Lula, representado pela frase “eles contra nós”, dita vezes sem conta em reuniões petistas espalhadas pelo país. Valeu-se dessa sugestão e conseguiu “unir os diferentes para derrotar os contrários”. O feitiço virou contra o feiticeiro. Todavia, imprudentemente, fez dos adversários verdadeiros inimigos, em desrespeito ao velho e bom regime democrático. E dificultou a espinhosa missão que terá pela frente – a de unir e pacificar o país de norte a sul.

Esse estado de espírito, que logo após a vitória pareceu que poderia tornar-se permanente, não pode prevalecer. O sucesso do presidente eleito depende dessa árdua e complexa missão. Felizmente, são bons os sinais em seu primeiro discurso: “Este governo será defensor da democracia, da Constituição e da liberdade”. E ainda explicou: “Não é a palavra vã de um homem. É um juramento a Deus”.

Tenho hoje, como tive ontem, o direito de sonhar com um país menos injusto. Desejo, ardentemente, que meus filhos, mas, sobretudo, meus netos, possam viver em permanente paz, distantes das ideologias que transformam seres humanos em autênticos autômatos.

Acreditemos no país, leitor!

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!