Quando paro para refletir sobre a educação no Brasil, ouso dizer, parafraseando Millôr Fernandes, que temos um grande passado pela frente. Temos um histórico déficit de oferta de educação, sem nem entrar no mérito da educação de qualidade. Se pensarmos que o projeto de universalização do ensino básico no Brasil se inicia por volta dos anos 1960 e 1970, vemos que a tentativa governamental de massificação do acesso à educação é muito recente. A universalização do ensino básico no país foi atingida só por volta de 2010, isso é pouco tempo e parece não estar funcionando.

Ainda ocupamos algumas das posições mais baixas do Programme for International Student Assessment (Pisa), uma avaliação internacional de habilidades básicas de leitura e de matemática, o que mostra o nosso fracasso na oferta de conteúdo, habilidades e competências mínimos para a existência de uma cidadania plena. Precisamos lembrar também que um terço dos brasileiros é analfabeto funcional. Quando a gente pensa que o ciclo escolar brasileiro é compreendido em, mais ou menos, 12 anos, e vemos que uma pessoa que passou todo esse tempo na escola sai dela sem o básico de leitura escrita e contas matemáticas, é sinal de que a escola não vem cumprindo o seu papel.

Outra grande crise é de credibilidade. Observamos uma série de iniciativas de descredibilização e perseguição a professores, intelectuais, pesquisadores e cientistas. Uma grande onda de obscurantismo mundial, bastante forte no Brasil especificamente, preocupa muito, pois vejo uma negação do conhecimento. Uma rejeição à sistematização intelectual faz com que os jovens passem a internalizar essas questões, neguem a importância da educação. Infelizmente, temos visto essa tendência nos últimos tempos.

A maior parte do movimento anti-intelectual usa um discurso falacioso de que essa educação que deu errado falhou por ser baseada na obra de Paulo Freire. Patrono da educação brasileira, ele é uma das maiores autoridades mundiais em educação e pedagogia. Um dos brasileiros mais citados em estudos internacionais e autor de obras clássicas como “A Pedagogia do Oprimido” ou “Pedagogia da Autonomia”. Eu afirmo que, com mais de 15 anos em sala de aula e já tendo lido boa parte da obra de Paulo Freire, a maior parte das escolas brasileiras não aplica nada das afirmações freireanas.

Se tivéssemos, de fato, uma pedagogia orientada pelos interesses dos alunos e pela formação de indivíduos complexos, autônomos, engajados e capazes de refletir e mudar a própria realidade, não teríamos 30% de analfabetos funcionais no Brasil. Nem mesmo teríamos indivíduos que negam a importância da educação, da intelectualidade e propagam os mais variados negacionismos, como nós temos hoje: climático, científico, histórico. Falhamos como um país que deveria oferecer educação.