Opinião

O Estado que privatizava

Saneamento básico e desestatização da Copasa

Por Elias Haddad Filho
Publicado em 19 de junho de 2020 | 03:00
 
 
 
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Recentemente, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apresentou os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua relativos ao ano de 2019, nos quais se destacam, em época de pandemia, os 16,4 milhões de brasileiros sem água potável, dentre eles 1,7 milhão residentes no Estado de Minas Gerais. 

Os dados apresentados na pesquisa são escandalosos sob o ponto de vista sanitário e revelam verdadeiro atentado aos direitos humanos. Desde 2010, é direito inalienável do cidadão dispor de abastecimento de água e esgotamento sanitário.

Para não ficar apenas nisso, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais anunciou imediatamente após a publicação dos dados da Pnad, autorização para que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) contrate “serviços técnicos necessários à estruturação e implementação do processo de desestatização da Copasa”, leia-se privatização.

A pergunta que fica é: como assim? São quase 2 milhões de mineiros sem água potável. Quem vai cuidar disso se o governo do Estado está prestes a abrir mão de seu único instrumento de política pública na área de saneamento?

O atual governador de Minas Gerais foi eleito com esse discurso privatista e, portanto, não está enganando ninguém. Mas o que pode vir a representar essa privatização para a população mineira?

Vamos olhar a pretendida privatização da Copasa com a frieza dos dados: a empresa não depende do Tesouro do Estado. Estudos feitos por bancos de investimentos apontaram que eventual venda das ações da Copasa pelo governo mineiro geraria caixa de não mais de R$ 5 bilhões, valor que não seria capaz de pagar dois meses da folha de pessoal do funcionalismo público do Estado.

A empresa tem investido em média R$ 520 milhões/ano nos últimos quatro anos, o que gera impostos e empregos no Estado e colabora para movimentar a economia de Minas. A Copasa também tem apresentado lucro líquido anual crescente nos últimos anos, chegando a R$ 754,4 milhões em 2019, o que gera dividendos mínimos de R$ 190 milhões para os acionistas (o Estado tem pouco mais de 50% das ações da companhia).

Será que, ainda assim, é vantajoso passar a companhia para o controle privado e deixar de poder fazer política pública para a população mais carente do Estado? Acredito que o governo cometerá um de seus mais graves erros nesta administração.

Talvez a pandemia da Covid-19 tenha vindo, entre outras coisas, para mostrar que a privatização e redução do papel do Estado não é, nem nunca será, a solução para todos os nossos problemas.
É possível ter uma empresa estatal comprometida com a boa política, gestão efetiva e universalização do saneamento, para com toda a população, incluindo aquela mais desassistida pelo Estado. Exemplos de empresas públicas de saneamento na Bélgica, França e em outros países são soluções a serem observadas com atenção.

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