Este mês completa uma década das manifestações que abalaram o país. O tema ainda gera diversas interpretações, e segue desafiador compreender as complexidades de seus desdobramentos.
Participei ativamente das atividades de junho de 2013, enquanto militante das Brigadas Populares e também do Comitê Popular dos Atingidos pela Copa do Mundo.
Criado em 2010 nas principais capitais brasileiras impactadas pela Copa do Mundo da Fifa, o comitê atuava em pautas como despejos, remoções forçadas, violações do direito ao trabalho, entre outros impactos dos preparativos para o Mundial sediado no Brasil em 2014.
Nesse contexto, houve inclusive mudança na legislação, com o fomento da Lei Antiterrorismo, que representava um ataque aos movimentos sociais, além de uma série de obras nas cidades que apontavam para um modelo de desenvolvimento que tinha como resultado a gentrificação e a expulsão dos pobres dos grandes centros urbanos.
Em Belo Horizonte, o Comitê Popular dos Atingidos pela Copa teve papel fundamental na convocação dos grandes atos de rua, assim como as Assembleias Populares Horizontais, reuniões amplas que aconteciam debaixo do viaduto Santa Tereza para discutir pautas políticas.
Inclusive, foi a organização de movimentos sociais e da própria Assembleia que evitou um fenômeno, comum em outras cidades, que foi a negação das bandeiras e dos partidos, fomentada pela extrema direita.
Junho de 2013 foi um período de intensificação de várias lutas populares, com grandes marchas. Também fizemos a ocupação da Câmara Municipal de BH, que conquistou a redução das tarifas de transporte, e depois, junto às ocupações urbanas que lutavam contra o despejo, ocupamos a prefeitura. Outro extrato desse período foi a ocupação cultural Luiz Estrela e as ocupações da Izidora, que hoje abrigam cerca de 9.000 famílias.
No entanto, 2013 também abriu uma caixa de Pandora em todo o Brasil com a novidade da extrema direita nas ruas. Há uma correlação entre esse período e a crise da Nova República, fase instaurada com a redemocratização, que cria pilares de desenvolvimento econômico e modelos de organização político-partidária no Brasil.
As manifestações demonstraram o descontentamento generalizado de diversos espectros políticos e escancararam a crise das instituições democráticas. No entanto, não concordo com quem aponta junho de 2013 como causa, mas acredito que foi um sintoma dessa crise nos pilares que sustentavam a Nova República.
Depois de 2013, vivemos a estagnação da ampliação de direitos sociais e o aprofundamento da crise econômica, com o posterior golpe contra a presidenta Dilma Rousseff e a ascensão de Bolsonaro, um político que se dizia da antipolítica.
Até agora está colocado o desafio de massacrar o pensamento fascista e superar a extrema direita que ocupa espaços de poder para propagar crimes e ódio. Com a eleição de Lula, podemos voltar a esperançar e agir para a reconstrução do nosso país, um Brasil democrático e onde caibam todos e todas.
No entanto, as recentes movimentações no Congresso Nacional demonstraram que, embora derrotada, a extrema direita segue ativa e também que não basta apenas ocupar as ruas.
Precisamos ampliar nossas estratégias, consolidando enfrentamento das redes de ódio e manipulação, ocupando espaços no Poder Legislativo e ocupando as ruas com pautas mais concretas que apoiem medidas populares para transformar a vida do povo brasileiro.
Bella Gonçalves é deputada estadual em Minas (PSOL)