No próximo fim de semana, os argentinos vivenciarão mais um importante processo eleitoral. Em agosto, realizaram-se as eleições primárias obrigatórias (Paso), nas quais três candidatos se destacaram na preferência do eleitorado. O libertário Javier Milei, do movimento Liberdad Avanza, foi o mais votado, seguido pelo peronista Sergio Massa e pela ex-ministra Patrícia Bullrich.
Há quatro anos o atual presidente, Alberto Fernández, chegou ao poder, repleto de promessas que agradavam a população do país. Crítico de seu antecessor, Fernández representava uma mudança: mais políticas sociais, mais atuação estatal na economia, mais atenção às classes mais pobres e uma agenda progressista para a sociedade argentina. Para a execução das promessas eleitorais, o governo precisaria de muitos recursos financeiros, o que se tornou cada vez mais difícil diante da economia do país.
Nos anos de governo de Fernández, o país mergulhou em uma séria recessão. Os bolsões de pobreza foram ampliados, a moeda foi desvalorizada, a inflação alcançou patamares preocupantes e a Argentina precisou solicitar empréstimos do Fundo Monetário Internacional.
Do ponto de vista político, também não foram dias de glória. A rivalidade entre o titular do Poder Executivo e a sua vice foi matéria para diversos episódios de disputas. O governo argentino passou a ser bombardeado por dentro e também por fora, de onde a oposição engrossou o tom de crítica à desastrosa condução do país. Assim como muitos candidatos de esquerda eleitos na América Latina nos últimos anos, Fernández prometeu uma festa sem ter recursos para realizá-la, e isso lhe custou a popularidade.
Sergio Massa é o candidato oficial e tem o apoio de grande parte dos grupos peronistas. O fato de ser o ministro da Economia da Argentina faz recair sobre ele responsabilidades difíceis de carregar. Massa representa o legado de Fernández, que ampliou a deterioração da economia do país em um curto prazo de tempo.
Os votos da direita devem dividir-se entre dois nomes. De um lado, temos Patrícia Bullrich, herdeira do macrismo, e do outro, Milei, representante de um discurso forte conta o establishment político tradicional. Bullrich ostenta uma importante experiência política incrustada em um discurso moderado. Milei, por sua vez, produz um som estridente aos ouvidos da esquerda, prometendo um Estado mais enxuto e a adesão de medidas sociais que fogem do que foi feito até agora no país.
É curioso que, a poucos dias do primeiro turno da eleição presidencial argentina, ainda há poucas pesquisas de intenção de voto divulgadas. As que foram produzidas demonstram cenários bastante incertos, com pouca distância entre os postulantes. Nas eleições primárias, grande parte das pesquisas indicava uma vantagem do candidato oficialista e uma desidratação de Javier Milei. O resultado oficial deu-se no sentido oposto: Milei colocou-se como o candidato preferido a vencer o pleito, contrariando as previsões apresentadas pelos principais institutos de pesquisa.
No Brasil, há grande preocupação sobre os rumos das eleições no país vizinho. O partido do presidente brasileiro já oferece ajuda para turbinar a campanha de Sergio Massa, uma vez que a vitória de um candidato da direita poderia ser prejudicial para as relações bilaterais entre os países. Especialmente a vitória de Milei colocaria o Brasil em uma situação complicada do ponto de vista de sua política exterior. Lula promete aceitar qualquer um dos eleitos como seu interlocutor.
Falta saber se, do outro lado, na Argentina, o presidente brasileiro será bem recebido por quem quer que vença o pleito no domingo.
Christopher Mendonça é doutor em ciência política e professor de relações internacionais do Ibmec-BH
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