A política da Argentina é um tema que frequenta de forma clara os debates e movimentos no Brasil. A parceria histórica entre brasileiros e argentinos, que evidentemente não se aplica ao futebol, pode ser observada principalmente nos fluxos comerciais entre os dois países, que desde os anos 1990 buscam aumentar o seu contato internacional por meio de instituições regionais, como o Mercosul.
Fernández e Lula, presidentes dos dois países, têm um alinhamento ideológico que os torna amigos. O mandatário argentino foi o chefe de Estado que mais vezes esteve no Brasil em 2023, em busca de novas parcerias que possam amenizar a caótica situação na qual o seu país se encontra. Alberto, como gosta de ser chamado, solicitou inclusive ajuda brasileira para negociar com o Fundo Monetário Internacional (FMI), ao qual precisou recorrer para garantir o funcionamento do país.
Em 2019 o atual presidente disputou um pleito eleitoral bastante polarizado contra o ex-presidente Maurício Macri. Uma das principais acusações promovidas pela frente de partidos peronistas era que o governo de turno havia desmontado as políticas públicas do país, prejudicando principalmente a população mais pobre. Alberto Fernández surgiu como uma esperança à esquerda, que levaria o país de volta aos trilhos. Diante da vitória do peronismo e de uma clara promessa de superação, a Casa Rosada voltou a ser um lugar seguro para a esquerda latino-americana.
O sonho durou pouco. Já nos primeiros meses veio à tona o desconforto de alguns grupos que conviviam dentro de um mesmo governo, o que desafiava a liderança presidencial. A própria vice-presidente passou a discordar publicamente de alguns posicionamentos de seu titular. As dificuldades em cumprir as promessas de campanha se ampliariam ainda mais diante de uma crise de desvalorização da moeda do país, agregada a uma penosa crise inflacionária.
A frente ampla que havia levado Fernández ao poder já não encontrava mais motivos para comemorar. O aumento da pobreza e a insatisfação social foram base para que a popularidade presidencial alcançasse os menores índices. Estamos novamente na preparação para uma nova eleição na Argentina. No próximo domingo se realizarão as prévias eleitorais, exigidas pela Constituição do país. Começaremos a vislumbrar aquela que pretende ser uma das mais incertas corridas eleitorais argentinas dos últimos anos.
Nomes importantes da política, incluindo o atual presidente, recusam-se a se oferecer novamente ao escrutínio popular. O governismo deverá lançar o nome de Sergio Massa, ministro da Economia desde 2022, que certamente terá a sua imagem relacionada ao desgaste sob o qual o país se encontra atualmente. Na oposição agrupam-se personalidades ligadas ao ex-presidente Maurício Macri, como a ex-ministra Patrícia Bullrich e o governante de Buenos Aires, Horacio Larreta. O midiático deputado Javier Milei também deverá fazer-se presente nesse páreo, que só deverá ser concluído no final do presente ano, quando se saberá o nome do próximo presidente argentino.
Pesquisas de intenções de voto, entre as quais destaca-se a que foi realizada pela Atlas Intel, na última semana, indicam uma possibilidade de que a esquerda, que tantas promessas fez na última eleição, seja substituída por um grupo alternativo. O tão citado retorno à esquerda, que teve início há quatro anos na Argentina, alcançando outros países da América Latina, começa a apresentar as suas limitações.
Christopher Mendonça é doutor em ciência política e professor de relações internacionais do Ibmec-BH
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