De acordo com os principais dicionários da língua portuguesa, o adjetivo “supremo” deve ser aplicado aos casos nos quais o sujeito está acima de qualquer outro ator ou contexto. Para os mais religiosos, é muito comum que a sua divindade seja um ser supremo, contra quem ninguém pode lutar com chances de vitória. Ser supremo é não estar sob condições de mudanças, de contestações, de dúvidas e de críticas.
Os modelos de democracia, criados na Antiguidade, mas aperfeiçoados em tempos modernos, implicam necessariamente uma dispersão do poder. Muita energia social foi gasta pelos nossos antepassados – e ainda são gastas em alguns contextos de autocracia – para que não houvesse ninguém com poderes inquestionáveis dentro de uma sociedade organizada.
Estudar as revoluções europeias não faz sentido se não houver o entendimento daquilo que se produziu por lá: não há espaço para um ser absoluto nos regimes políticos contemporâneos.
Os pensadores da democracia americana, Madison, Hamilton e Jay, chamados também de “federalistas”, tomaram de empréstimo as ideias de Montesquieu e defenderam que a divisão do poder em uma república fosse realizada de forma equânime, e não concentrada em uma figura pessoal. Não é aceitável que uma pessoa tenha a capacidade de travar algo que já foi decidido com claras maiorias por outros Poderes constituídos.
Nesta semana, veio à tona uma discussão importante. O Supremo Tribunal Federal é realmente inquestionável e imutável? A minha defesa é que essa hipótese precisa ser totalmente abandonada.
Em um país cuja Constituição alcança recordes de emendamentos em diversos assuntos, não é razoável que os parlamentares sejam proibidos de alterar cláusulas que tratam especificamente do funcionamento do Judiciário.
A PEC 2 de 2021, aprovada com o objetivo de impedir que um único ministro do STF tenha capacidade de suspender decisões tomadas pelos outros Poderes, não é apenas conveniente, mas necessária. Não há nela contestação sobre a autoridade da Corte, mas de seus componentes de forma isolada. Nesse sentido, o novo texto que será, em breve, apreciado pela Câmara dos Deputados, orienta que decisões revogatórias de leis aprovadas no Congresso sejam aplicadas exclusivamente a partir de maiorias colegiadas.
Mesmo havendo uma tramitação que não promete ser célere, parece-me que alguns ministros da Suprema Corte estão levando muito a sério a aplicação do adjetivo que nomeia a instância decisória por eles composta.
Talvez, a fim de evitar constrangimentos, fosse uma solução alterar o nome do Supremo Tribunal Federal para “apenas” Corte Constitucional, para que os magistrados tenham a ciência de sua função, sem, todavia, esquecer que debaixo das luxuosas e caras togas talares de cetim há corpos que adoecem e que certamente serão substituídos.
Infelizmente, o perfil do presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco, é de pouco embate. Para engrossar a voz do mais alto representante do Poder Legislativo, é necessário um esforço hercúleo que muitas vezes não é recorrentemente alcançado. Até que se tenha um líder mais altivo, a cena comum será uma em que telefonemas e reuniões com os grandiosos ministros sejam suficientes para amedrontar os representantes do povo.
Christopher Mendonça é doutor em ciência política e professor de relações internacionais do Ibmec-BH
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