Cristovam Buarque

Lições da Ucrânia

Guerra mostra o risco da falta de alternância no poder


Publicado em 11 de março de 2022 | 03:00
 
 
 
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A primeira lição é o custo elevado de invadir um país. Até aqui, Rússia e Estados Unidos invadiram Afeganistão e Iraque, sem que houvesse sanções. Graças à Ucrânia, estamos descobrindo o preço de invasões.

A segunda lição é a constatação de que os mesmos países que rejeitam refugiados da Síria e da África, são generosos e solidários com ucranianos. O mundo deve cobrar da Europa braços abertos aos refugiados que fogem da guerra e da pobreza.

Outra lição: a guerra da Ucrânia permite perceber o erro cometido, 30 anos atrás, quando as nações ocidentais não aproveitaram a falência da União Soviética para apoiar a Rússia, exigindo seu desarmamento nuclear. Mas, no lugar de estender a mão e ajudar na recuperação econômica da Rússia, em troca de incorporá-la em paz no capitalismo, o Ocidente preferiu fortalecer a Otan e cercar a Rússia com armas.

A Rússia encontrou um autocrata que manipulou regras democráticas para ficar no poder por tempo indeterminado. Além de recuperar a economia, Putin usou a ameaça externa para se fortalecer internamente, a ponto de invadir um país vizinho, com o argumento de que se protegia contra as forças inimigas do Ocidente. Agora, o mundo está sujeito à chantagem nuclear que Putin usa para limitar a intervenção ocidental na guerra.

A invasão da Ucrânia ensina o risco do desastre político decorrente da falta de alternância no poder. Em poucas semanas, Putin deixou de ser reconstrutor da Rússia e passou à história como dirigente irresponsável, algoz de um país menor. Além de invadir uma nação soberana, desfaz a economia de seu próprio país, devido aos efeitos das sanções que viriam e ao isolamento consequente em um tempo de economia global. Longevidade no poder cria sentimento de onipotência, diminui o senso crítico pessoal, produz assessores submissos, assustados e temerosos, que por medo de desagradar ao autocrata negam as informações corretas.

As surpresas de Putin são resultado do temor de seus assessores e informantes para alertarem que o presidente ucraniano não era apenas um ator, era um líder capaz de mobilizar seu povo a lutar na defesa de seu país, nem informaram que a Europa e os Estados Unidos se uniriam e que sanções draconianas seriam impostas.

A Europa aprendeu também a necessidade de diversificar sua matriz energética para fontes renováveis e origens diversas.

A Ucrânia mostra ainda, para todos nós, o risco de tomar decisões com base no antagonismo e no preconceito. É o “antiamericanismo” que está levando parte da esquerda brasileira a não analisar a realidade do momento e ficar do lado de Putin, apesar de seu crime.

A história nos ensina estas lições, não se sabe ainda se elas serão consideradas nem a que custo.

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