DURVAL ÂNGELO

Direitos humanos: um novo olhar

O relatório da Comissão da Verdade no Estado de Minas Gerais


Publicado em 04 de dezembro de 2017 | 03:00
 
 
 
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“Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”. O artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos é o princípio norteador desse importante documento, que no último domingo (10) completou 69 anos e é foco de uma campanha da ONU para motivar a reflexão.

O assunto tem pautado vários debates. Se muitos reafirmam a importância da declaração e a universalidade e perenidade de seus valores, outros apontam para sua limitação. Mas todos concordam em um ponto: o documento é ainda uma “promessa” não cumprida. Como atestou o chefe dos Direitos Humanos da ONU, Zeid Ra’ad Al Hussein, em nome de projetos de poder, a Declaração Universal dos Direitos Humanos tem sido intensamente contestada. Ele cita crueldades e crimes contra a dignidade humana em conflitos por todo o mundo, enquanto cresce um nacionalismo xenofóbico, racista e discriminatório, sob o olhar impassível de nações complacentes.

Mas estes são tempos de paradoxos. Em meio aos protestos contra as violações, despontam vozes que questionam a própria linguagem dos direitos humanos, sinalizando a necessidade de avanços. Para o sociólogo Boaventura de Sousa Santos, os direitos humanos se tornaram uma narrativa hegemônica, incapaz de abarcar a pluralidade. Ele observa que a aspiração da dignidade está presente em todas as culturas e é expressa em narrativas distintas, não raro, incompreensíveis para quem delas não comungue.

“A grande maioria dos seres humanos não são sujeitos de direitos humanos, são antes objeto dos discursos estatais e não estatais de direitos humanos”, ressalta, acrescentando que muitos sofrimentos humanos não são considerados violações. Lembra ainda que os direitos humanos têm sido invocados para justificar invasões de países, pilhagens e assassinatos de inocentes, em nome de uma suposta emancipação.

Aprender com os erros – do passado e do presente – é um dos caminhos para a defesa e o avanço dos direitos humanos. Nesse sentido, pode dar grande contribuição o relatório da Comissão da Verdade no Estado de Minas Gerais, apresentado nessa quarta-feira (13) na Assembleia Legislativa, a requerimento de minha autoria e entregue oficialmente em solenidade no Palácio da Liberdade.

Por quatro anos, o colegiado investigou violações de direitos humanos ocorridas no Estado, em especial as decorrentes da ditadura militar. O documento, de 1.600 páginas, vai além do registro histórico. Ao fazer centenas de recomendações, configura também um instrumento para a reparação e compensação de violências cometidas e adoção de medidas de combate a violações futuras.

Enxerguemos o mundo com olhos de Blimunda, como propõe Boaventura. Mais do que ver, a personagem de Saramago tinha o dom de enxergar: a estrutura, a essência e as vontades de cada ser. Recolheu, assim, “2.000 vontades”, a fim de construir uma “máquina de voar”. Quem sabe não seja esse o início de nosso voo...

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