(Cena 1. Sala de um prédio luxuoso. Em volta de uma mesa de reuniões, diversas pessoas conversam animadas. São sócios, parceiros).

- E então, tudo certo? – diz o chefe.

- Sim, a fase 1 foi concluída esta semana! – responde o subchefe.
Todos aplaudem, felizes, alguns dão tapas na mesa, assoviam. O cara assentado à cabeceira gesticula, pede silêncio.

- Agora, todos os habitantes do planeta têm um celular. Passam o dia inteiro cutucando a tela com o dedo, lendo mensagens, mandando memes. Crianças não brincam mais, adultos não conversam, namorados só trocam emoticons.

- Muito bem! – novos aplausos e assovios.

- Conforme nosso projeto inicial, ninguém mais acha graça na natureza, num bicho, numa árvore, numa paisagem. Só admiram e comentam quando o troço aparece em alta definição na telinha, não é mesmo? O real não importa: só o virtual encanta...

- Na festa, no show, ninguém mais aproveita o momento, a música, a companhia. Pega o celular e filma para botar no Instagram. Não visitam os parentes, não almoçam juntos! A meninada, então, completamente dominada! Em vez de jogar com os colegas, passam horas hipnotizadas nos games de futebol! Nem conseguem mais chutar uma bola!

- Hip-hurra! Viva! Boa!
(Cena 2. Mesma sala de reunião, as mesmas pessoas. O diretor exibe uma tela com diagramas e gráficos).

- Bem, pessoal, a próxima fase é decisiva. Como planejado, é hora de ativar o vírus...

Todos esfregam as mãos, excitados. O mais distraído pergunta:
- Vírus digital, né, chefe?

Ouvem-se vaias, apupos. O diretor pede calma:
- Não, não. Nosso setor do oriente já cuidou da mutação do bicho. Em breve, entramos na fase 3, aguardem!

(Cena 3. Mesmos atores e figurantes. Mesma sala, porém enfeitada com balões, faixas, serpentinas. Sobre a mesa, garrafas de champanhe, taças. Clima de euforia, abraços, sorrisos e apertos de mãos. O diretor, sorridente, bate num copo e pede a palavra):

- Pessoal! As fases finais foram concluídas, sucesso absoluto! A humanidade está sob nossos pés. Com a inserção do vírus, agora tudo só pode ser feito exclusivamente via internet, nos celulares e tablets! Trabalho? Home-office! Compras? Só on-line! Cinema? Só streaming! Bater papo com amigos? Vai pro chat! Pagamento de contas? Só pelo site do banco! Reuniões? Entre pelo aplicativo! Ninguém mais sai de casa!

Um dos sócios fez cara de inocente, só de provocação:
- E sexo?
- Ora! Este foi fácil! Os sites pornôs são um sucesso!
Risos, novos abraços, brindes e gritaria.
- Parabéns a todos! Já temos o controle. Com a humanidade dominada, vamos ao golpe de mestre: preço da internet reajustado a cada semana, sem choro! Ficaremos bilionários!

(Cena 4, final. Sala do diretor. Vê-se o próprio contando montanhas de dinheiro sobre a mesa de mármore negro. Súbito, um auxiliar entra esbaforido).

- Chefe! Temos um problema sério! A câmera de segurança AC-456 acabou de gravar! Um homem largou celular, tablet, computador, sala de chat, tudo. Saiu pra rua de mãos dadas com uma mulher. Descalços, deitaram num gramado, olhando pro céu, sorrindo... Sei lá, pareciam livres e felizes! Até... se beijaram, acredita?

O chefe não tirou os olhos da pilha de dinheiro. Apenas balbuciou, raivoso:
- Acione imediatamente a patrulha de extermínio!