FERNANDO FABBRINI

Superações

Só o melhor convence e transforma


Publicado em 04 de fevereiro de 2021 | 03:00
 
 
 
normal

Não bastasse o nome esquisito, Buckminster Fuller era um cara estranho mesmo; um daqueles ET’s que aparecem de vez em quando no planeta e mudam a história. Aluno brilhante de Harvard, foi expulso por comportamento afrontoso e indisciplinado. Seguiram-se um casamento conturbado, apertos financeiros e sérios contratempos familiares.

Depois sua vida entrou em parafuso. Desemprego, alcoolismo, drogas e a morte da filha adolescente jogaram Richard numa fossa abissal, incluindo tentativa de suicídio. Porém, dizem que no fundo do poço às vezes existe uma mola, devolvendo-nos à luta diária. Fuller teve esta sorte. Recuperado, decidiu concentrar-se numa experiência singular: “descobrir o quanto poderia um único indivíduo contribuir para mudar o mundo e beneficiar toda a humanidade”.

Arquiteto, cientista, matemático, designer e inventor, Buckminster Fuller provou sua teoria e efetivamente contribuiu para um salto da civilização em certos setores. Mais conhecido em círculos restritos, exibiu sua genialidade no projeto do domo geodésico, ideia que mudou os rumos das estruturas autossustentáveis e influenciou a arquitetura do mundo inteiro. Estudos matemáticos de Fuller estão presentes nos rudimentos da informática, nas pesquisas das estruturas das plantas e minerais (o sujeito era devoto ardente da sequência Fibonacci, como imaginei) e até nos games de computador.

A mente brilhante e inquieta de Fuller deu-nos ainda frases e reflexões estimulantes. Particularmente, gosto desta: “você nunca vai mudar uma realidade só brigando contra ela. Se quiser mesmo mudar algo no mundo, construa uma ideia melhor e torne a outra obsoleta”. Este conceito se aplica não apenas na ciência. Podemos utilizá-lo também nos hábitos domésticos, no ambiente das empresas, nas escolas, nos comportamentos. E até na política, quer ver?

Se você não gosta do governo, não adianta fazer piadas, espernear, bater boca, xingá-lo nas redes sociais. Tudo besteira. Lembremos Fuller: no caso da política, o caminho seria entender bem o momento, trabalhar uma nova alternativa, um candidato competente; mostrar aos eleitores alguém capaz de superar os demais nas urnas – e o resto aconteceria naturalmente. No entanto, a oposição brasileira age exatamente ao contrário. O marketing da arrogância e da velharia continua imbatível.  

Na carreata organizada às pressas pela esquerda, sonhando que o Maia – já de partida - botasse o impeachment do atual presidente na mesa, observei de minha janela erros clássicos. De saco cheio com a droga da pandemia, qual “massa” queria saber de impeachment, de mais confusão numa hora dessas? Desconfio que o povão não compreenda bem o termo “genocida”, berrado ao som das panelas. Já outro grupo, mais atento ao léxico e à gravidade da situação mundial, discorda da referida ofensa. Uma faixa pedia: “Nem Bolsonaro, nem Mourão! Nova eleição já!” – imaginem. Até bandeiras com a cara do Lula rejuvenescida no silkscreen tremulavam ao vento dominical. Só faltou trilha sonora do Vandré para completar o cenário de volta ao passado.

E assim, no vácuo de ideias novas, originais e consistentes, navega-se nas ondas da superficialidade. Se muitos perderam a noção da diferença entre o essencial e o acessório, vale repensar os conselhos de Fuller. Talvez assim façamos algo mais útil para, por exemplo, combater as ofensas contra as mulheres, em vez de infantilmente demonizar o nome da roupa feminina “tomara-que-caia”. Ou dar importância, levar a sério um rapaz choroso que se arrepende publicamente na TV por ser “homem-branco-hétero-opressor-privilegiado”.  

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!