FLÁVIO SALIBA

O Brasil é imune ao tempo e à modernidade

Redação O Tempo


Publicado em 15 de setembro de 2017 | 03:00
 
 
 
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O Brasil é imune ao tempo. O passado nada de braçada no presente, e o presente parece não ter futuro. O poder continua nas mãos de meia dúzia de donatários cujas extensas famílias se incumbiram, muito antes do PT, de aparelhar o Estado e afugentar quem, um dia, ousou fazer o mesmo.

Estão por toda parte: no Executivo, no Legislativo e no Judiciário, e não largam o osso que os sustenta, legítima ou ilegitimamente. A modernização não atingiu a vida política brasileira, e se o fez foi pelas beiradas, ampliando as oportunidades para a bandidagem nutrida numa sociedade civil sem eira nem beira. Não há justiça ou democracia que funcionem a contento num ambiente desses.

Como já dizia Nelson Rodrigues, “subdesenvolvimento não se improvisa; é obra de séculos”, resumindo numa frase o que enfadonhos estudos acadêmicos foram incapazes de perceber. Inspiro-me nessa frase para afirmar que democracia não se improvisa; é, também, obra de séculos. Com isto quero dizer, mais uma vez, que democracia política substantiva só floresce em sociedades que antes experimentaram um processo de democratização das relações sociais – outra realidade que as ciências sociais ignoram.

Historicamente, tal democratização esteve estreitamente associada à igualdade e à liberdade propiciadas pelas relações de mercado, correspondendo ao que chamamos de “direitos fundamentais da cidadania civil”, cuja emergência, nos países capitalistas ocidentais, data do século XVIII. É essa cidadania civil substantiva que propicia a cidadania política e a consequente emergência de regimes políticos estáveis e efetivamente democráticos.

Por que isso não aconteceu no Brasil? Porque estamos longe de ser uma sociedade de mercado, o que explica nossa instabilidade política e, inclusive, a profunda crise político-institucional que ora presenciamos. O conservador Roberto Campos sabia disso ao afirmar que “o que certamente nunca houve no Brasil foi um choque liberal. (...) O liberalismo econômico, assim como o capitalismo, não fracassou na América Latina. Apenas não deram o ar de sua graça”.

Ora, se o capitalismo deu o ar de sua graça no Brasil foi apenas à custa do Estado controlado pelas velhas oligarquias. Estas trataram de se alojar nos bancos e empresas estatais, nos órgãos controladores das atividades econômicas, nas companhias de economia mista e em todo e qualquer nicho de poder onde viam oportunidade de ganhos pessoais. As grandes empresas capitalistas nacionais e internacionais se viram na contingência de dizer “amém” a qualquer burocrata de segundo ou terceiro escalões.

Ora, nessas circunstâncias, é o próprio Estado que, ao privilegiar quem dá mais (propina?), fomenta os cartéis e suprime o fundamento do capitalismo e das relações de mercado, que é a livre concorrência. Alimenta, com isso, as condições que favorecem o atraso e o crime organizado.

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