Flávio Saliba

O poder e a motocicleta

Questão indígena, violência e reforma eleitoral


Publicado em 03 de setembro de 2021 | 03:00
 
 
 
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O Brasil continua em chamas, e eu me pergunto por onde anda o ex-ministro do Meio Ambiente com aquela cara de bom moço. Não deu sequer para ser aproveitado no Planalto. Talvez esteja “passando a boiada” em Miami ou vendendo terras na Lua.

Enquanto isso, os índios brasileiros se manifestam em Brasília, sem grandes esperanças, pela demarcação de suas terras, contra o desmatamento e a mineração ilegais por parte de predadores de terno e gravata que negociam, sabe-se lá onde, suas toneladas de ouro. Tal depredação só é possível pela existência de muita gente sem trabalho disposta a se embrenhar na mata arriscando a vida em troca de migalhas. É pelas mãos dessa gente sem eira nem beira que os indígenas brasileiros entram em contato com a “civilização” e não há ONGs ou missionários que possam dar um basta a essa situação. Só nos últimos dez anos mais de 2.000 índios foram assassinados no Brasil pelas mãos de grileiros, matadores de aluguel e invasores de suas terras.

Em paralelo, o chefe da nação, que pelo visto pretende ficar no poder por prazo indefinido, prefere os fuzis ao feijão. Não é à toa que a venda de armas no Brasil teve um aumento de 200% no primeiro semestre de 2020 em relação ao mesmo período de 2019. Segundo o Sistema Nacional de Armas (Sinarm), das 73.985 armas vendidas nesse período, 62% foram compradas por cidadãos comuns. Isto para não falar das que foram parar nas mãos de bandidos que, obviamente, recorrem ao mercado informal e ao contrabando. A título de comparação, entre 2017 e 2019 os números da PF mostraram um aumento médio de apenas 1.200 armas ao ano.

O incentivo ao uso de armas chega a ser imoral num país que acaba de presenciar o mega-assalto a bancos em Araçatuba por quadrilhas fortemente armadas com fuzis, um sem-número de explosivos espalhados por vários pontos da cidade e drones para monitorar a polícia. Três mortos, seis feridos, reféns e pânico foram o saldo da audácia de uma bandidagem cada vez mais à vontade de norte a sul do país, passando, é claro, por Brasília.

Violência, quase 600 mil mortos pelo coronavírus, corrupção, desemprego, pobreza, fome, crise hídrica, inflação, juros e dólar nas alturas são alguns dos ingredientes que nos levam ao abismo e alertam sobre o risco de nos tornarmos em breve uma espécie de Afeganistão. Enquanto o presidente da nação percorre ruas e avenidas do país em cima do simbólico autoritarismo de uma motocicleta, o Congresso tenta aprovar às pressas um novo código eleitoral. Entre outras lambanças, a reforma política propõe a quarentena de cinco anos para a candidatura de militares, juízes, promotores e policiais a cargos públicos. Tal medida seria um avanço se não tivesse como única finalidade espúria inviabilizar a candidatura de Sergio Moro à Presidência da República. Isso para não falar de eventuais candidaturas de outros respeitáveis nomes no cenário político nacional.

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