Opinião

Paranoia e teorias da conspiração

A polarização tem promovido a anomia e a insensatez


Publicado em 11 de dezembro de 2020 | 03:00
 
 
 
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Entre a miríade de efeitos colaterais perversos da globalização econômica, os avanços da paranoia e das teorias conspiratórias emergem como elementos fundamentais da polarização político-ideológica na sociedade contemporânea. Paradoxalmente, a polarização que, em princípio, pressupõe a coesão dos cidadãos em torno de ideais e propósitos opostos tem promovido, no plano individual, a anomia e a insensatez posto que fundada em falsas informações e práticas contraditórias. A guerra fria, por exemplo, voltou como farsa já que os supostos inimigos se encontram umbilicalmente ligados por investimentos econômicos supranacionais. 

Se, hoje, a China é uma ameaça à supremacia dos Estados Unidos, é porque a necessidade de expandir mercados associada aos baixos custos de produção atraíram capitais e tecnologia norte-americanos e europeus para aquela nação. Por um conjunto de razões que não cabe discutir aqui, a globalização apesar de promover o crescimento econômico em várias partes do mundo e, principalmente, acelerar o crescimento da economia chinesa, gerou efeitos sociais perversos, inclusive nas sociedades avançadas. A brutal concentração de renda, a perda de poder aquisitivo da classe média, a instabilidade no trabalho, o desemprego e, consequentemente, o descontentamento de muitos norte-americanos foram os ingredientes que faltavam à ascensão de um governo de extrema direita e de suas teorias da conspiração. O inimigo comunista está em toda parte: nos Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário e, sobretudo, na cultura, já que a luta pelas armas deu lugar à formação das almas. 

Na visão dos “teóricos” da extrema direita, trata-se de um plano cuidadosamente orquestrado pelos soviéticos que remonta aos anos 30 do século passado. Se assim é, estamos numa guerra sem fronteiras. Mas não. Com ou sem razão, o vilão é a China comunista que ameaça dominar o mundo. A despeito do que isto possa ter de verdade, o argumento de um dos teóricos de direita mais conhecidos dos brasileiros, a China já não é mais comunista, e o próprio comunismo deixou de existir. Cedeu lugar a um punhado de megabilionários. Segundo ele, esses senhores controlam a economia mundial investindo também em nações comunistas e financiando a esquerda via organizações políticas, acadêmicas, de direitos humanos, do meio ambiente e, mesmo, de entidades ligadas à Organização das Nações Unidas.

A pergunta que fica no ar é: por que cargas d’água esses megabilionários financiam organizações de esquerda? Como são movidos pela busca de lucros, compreende-se que aproveitem oportunidades de investimentos em qualquer ditadura de esquerda ou de direita. Mas aí o problema é outro: é abonar e sustentar os déspotas, é minar democracias via corrupção, é defender o Estado mínimo para eliminar barreiras à realização de seus lucros, é instaurar o despotismo do oligopólio.

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