Flávio Saliba

Psicopatia e cultura de massa

Dois textos sobre aspectos da sociedade hoje


Publicado em 16 de abril de 2021 | 03:00
 
 
 
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1)

A morte do menino Henry Borel me faz retomar um tema abordado neste espaço há mais de uma década: o da psicopatia. Segundo a psiquiatra Ana Beatriz Silva, o psicopata desconhece as regras sociais e é desprovido de sentimento de culpa ou remorso. É um mentiroso contumaz, conquista facilmente as pessoas e só é capaz de estabelecer relações superficiais, que terminam assim que ele atinge seus objetivos.

O psicopata não tem alucinações e é plenamente consciente de seus atos. Os portadores desse transtorno são possessivos, jamais reconhecem os próprios erros, adoram ser o centro das atenções e, com frequência, causam danos a amigos e familiares.

Mas há gradações entre os psicopatas dos tipos leve, médio e severo, e, ao que se sabe, apenas estes últimos seriam propensos a matar e a praticar atos de crueldade extrema. Alguma dúvida sobre onde se encaixam os responsáveis pela morte de Henry?

Estima-se que 3% da população brasileira seja composta de psicopatas e que entre presidiários esse percentual esbarre nos 40%. Estima-se, também, que nos últimos 50 anos o número de portadores deste mal tenha crescido vertiginosamente, já que “o cenário social dos nossos tempos favorece o estilo de vida do psicopata”. Eles se infiltram em todos os âmbitos do tecido social: na medicina, no direito e, notadamente, na vida política.

2)

Dois recentes artigos na revista “Época” abordam as relações entre negócios e música condenando a postura elitista dos críticos de gêneros como o axé, o sertanejo e o funk.

Em seu artigo, Jerônimo Teixeira afirma: “O preconceito contra o artista que ganha dinheiro com seu trabalho já era sentido no Renascimento. Vender as obras era algo malvisto”.

Já o artigo assinado pela cantora Anitta faz uma aberta defesa do funk. Concordo com ela que “o barquinho vai, a tardinha cai” não corresponde à realidade do povão. O Brasil virou uma sociedade de massa com profundas desigualdades sociais sabiamente exploradas pela indústria fonográfica e a mídia.

Há uma simbiose entre elas e o gosto popular que se reforçam. Anitta se pergunta: “Se para o funkeiro a diversão é rebolar, se é pelo prazer da conquista entre duas pessoas, se o sexo não é um tabu e é visto como algo natural e prazeroso, qual o problema?”. E responde, “Nenhum”.

Eu me pergunto: quem vai cuidar dos rebentos dessa farra? A pobreza no Brasil tornou-se hereditária entre famílias chefiadas por mulheres com renda inferior a dois salários mínimos. Estas correspondem a cerca de 40% das famílias nesta faixa de renda, ultrapassando os 50% nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro e Salvador.

Por sua vez, um médico que cuidava de 250 pacientes de Covid, num hospital de São Paulo, acionou a polícia para interromper um “pancadão” que o impedia de escutar os enfermos. A polícia alegou não poder interromper o evento que concentrava mais de 2.000 pessoas. Não mencionou o fato de que sua ação costuma ser impedida em áreas controladas pelo crime organizado.

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