Este texto sai pouco antes do resultado do pleito e está sujeito às intempéries do clima eleitoral, à gangorra das pesquisas e aos ventos do Senhor Imponderável das Neves. Pelas últimas consultas, não há tempo para estreitar a distância de votos que separa Jair Bolsonaro do petista Fernando Haddad.
Sob essas ressalvas, faremos alguns apontamentos, a partir da vitória eventual de Jair Bolsonaro. As observações poderiam ser dirigidas também ao candidato petista.
Primeiro, a mudança de patamar. Ele há de entender que será governante de todos os brasileiros, e isso exige altruísmo, compromisso cívico de tentar juntar os cacos quebrados na campanha, que teve como ferramenta uma linguagem desabrida e radical, defendendo um legado de terror, tortura e medo.
Se não resgatar a chama de pacifismo e bom senso, e continuar sob a expressão de expurgo de contrários, poderá correr sangue pelas ruas.
Combate às mazelas de nossa cultura política – mandonismo, caciquismo, nepotismo, grupismo, enfim, fisiologismo – não combina com populismo. Conter custos, cortar cargos, atenuar a burocracia, reduzir ministérios são medidas que exigem coragem na esteira do que prometeu Tancredo Neves: “Meu primeiro decreto terá um único artigo: é proibido gastar”.
Urge andar sobre o fio da navalha, escolhendo quadros técnicos qualificados, ao mesmo tempo atendendo demandas políticas. O presidencialismo de coalizão contempla a repartição de poder. Impõe-se o dever de preservar a operacionalidade da máquina, livrando-a de pressões de partidos e grupos.
Desafios enormes estão à vista: como compatibilizar a visão nacionalista dos militares, de um Estado forte, com preservação de empresas estratégicas, e o anseio do Estado mínimo, de gosto do mercado, com conglomerados privados querendo abocanhar nacos das estatais? Haverá como dosar políticas liberais com o intervencionismo estatal em áreas vitais? Até onde Paulo Guedes poderá privatizar sem romper o casulo do nacionalismo militar?
Áreas sensíveis às massas estarão entre as prioridades, como a segurança. O choque que o novo presidente promete oferecer – “bandido bom é bandido morto” – tem condições de ser empregado? Essa questão envolve situações complexas, como forças mais bem-preparadas (novas modalidades?), inteligência, maiores recursos, balanceamento entre ações preventivas e ofensivas, eficiente patrulhamento nas fronteiras etc. Por mais que ataque a bandidagem, não se espere melhoria no curto prazo.
O consumidor, o anônimo das ruas, o habitante das margens esperam um bolso mais recheado, o sustento da família, condições de adquirir remédio, comida, transporte, as coisas do sofrido cotidiano. Seriam atendidos antes de serem convocados pelos movimentos sociais?
Vale enfatizar que as oposições, a partir do PT, estarão de olho nas curvas do novo governo. Querem ganhar fôlego e voltar a lutar pelo poder. Derrapadas eventuais ou atrasos no cronograma das ações serão motivo para a agitação das ruas.
Que Deus ajude o país!