GILDA DE CASTRO

Miséria e opulência na contramão da modernidade

Ilhas de prosperidade numa imensidão de áreas miseráveis


Publicado em 11 de fevereiro de 2017 | 03:00
 
 
 
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A Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável da ONU divulgou o Relatório Mundial da Felicidade, mostrando que a Dinamarca ocupa, mais uma vez, o topo da lista de 156 países quanto à satisfação das pessoas diante da vida. Esse ranking, criado em 2012, inspira a elaboração de medidas próximas da social-democracia, em que o Estado regulamenta a política e a economia para garantir serviços públicos de alta qualidade para todos, como tem acontecido nos países nórdicos. Os impostos são elevados, e exige-se austeridade em todas as despesas para que nada falte aos cidadãos comuns, encaminhando igualdade de condições de subsistência, sem ostentação ou luxo de nenhuma categoria social. Os dinamarqueses cultivam, assim, o “hygge”, que é a sensação de conforto e o sentimento de felicidade por ter pequenas coisas. Isso tem promovido alto grau de confiança nos outros e nas instituições, especialmente nos agentes públicos, pois existem políticas rigorosas, em que se exige deles honestidade em todas as ações. Assim, o último escândalo foi em 2011, quando o primeiro-ministro não conseguiu justificar uma despesa de US$ 145. Dinamarca, Suécia e Noruega cuidam tanto da disciplina fiscal que não adotaram o euro, e o último país não integra a União Europeia. Seu rei, Harold V, viaja apenas em voos comerciais, acompanhado apenas de seu secretário.

Trata-se de uma situação oposta à brasileira. Habitantes dos aglomerados do Rio de Janeiro improvisam tanto na construção de suas moradias, em áreas de alto risco, que viraram atração turística para europeus chocados com a dramática diferença entre, por exemplo, a Rocinha e as magníficas mansões de São Conrado. A medicina de ponta de alguns hospitais está em oposição à precariedade das instituições públicas e às péssimas condições sanitárias que permitiram a retomada de enfermidades controladas no início do século XX. Ilhas de prosperidade aparecem numa imensidão de áreas miseráveis espalhadas por todas as regiões e metrópoles, incluindo a capital federal. E, sobretudo, há enorme fosso social entre a classe trabalhadora e as autoridades estaduais e federais, que vivem nababescamente e em promiscuidade com pagadores de propinas bilionárias em detrimento da população inteira. Sabendo que despertam a ojeriza dos cidadãos de bem e são responsáveis pelo aumento da criminalidade, demandam gastos absurdos com sua segurança pessoal, enquanto as pessoas comuns padecem com problemas de todo tipo.

O Brasil caminha, portanto, em direção contrária à modernidade, fomentando os desequilíbrios sociais. Isso é estratégico para preservação do establishment, amplamente favorável às oligarquias do momento. O sistema educacional canhestro, falacioso e ineficiente faz parte desse projeto de poder, que se fortalece com políticas públicas constituídas por migalhas oferecidas a um povo faminto, analfabeto e carente de informações sobre a cidadania própria do terceiro milênio.

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