JOÃO BATISTA LIBÂNIO

Ética cristã: uma visão do extremo da perfeição

Certas normas de comportamento não gozam de valor universal


Publicado em 08 de setembro de 2013 | 03:00
 
 
 
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As palavras passeiam entre certo espaço restrito quanto ao significado, permitindo assim o encontro linguístico das pessoas e alguma mobilidade semântica que causa confusões. O termo ética participa de algo de tal ambiguidade. Para alguns teóricos só se fala de ética com rigor se se argumenta a respeito de valores fundamentais a partir da razão humana secular. As religiões constroem para os seus seguidores normas de comportamento, de princípios que pertencem antes à moral do que a ética. Esta se reserva ao pensar racional, filosófico.

A ética tem pretensão de universalidade própria da razão humana. Assim quando se trata de instituições particulares que prescrevem regras de agir para os seus membros cabe melhor falar de moral e não de ética. Os médicos, os engenheiros elaboram códigos de moral. Não raro acontece que uma ação considerada contra a moral médica não o seja contra a ética ou, pelo menos, discutível. À guisa de exemplo, vale o caso de que alguém deixasse escrito ou a família consentisse que se lhe desligassem os aparelhos que o mantêm em vida vegetativa. A ética aceitaria tal decisão. Mas a moral jurídica ou médica, em certos países, considera ação criminosa.

A Igreja Católica elaborou uma moral sexual, sacramental que obriga o comportamento dos católicos. Mas, em não poucos casos, discute-se se realmente se trata de algo contra a ética enquanto princípio universal percebido pela razão. Acontece que juízes católicos se sentem entre dois fogos. Por um lado, a moral católica prescreve-lhes, enquanto católicos, certo modo de proceder. E, doutro lado, ao encarar o problema a partir da discussão racional julgam o oposto. Discutiu-se o caso da prática de anticonceptivos que contrariam a moral sexual católica, mas que alguns julgam eticamente correta para evitar a propagação de doenças sexualmente transmissíveis. Conta-se que o próprio João Paulo II, depois de constatar a trágica situação em regiões da África da proliferação da Aids, em suas visitas, silenciou tal questão nos discursos.

Percebida a diferença entre a ética de caráter racional e universal e a moral de cunho particular e decidido por instituições, permanece a pergunta se se pode então falar de uma ética cristã. Se, por cristã se entende a doutrina de uma determinada igreja, parece inadequada expressão. Caberia falar de moral cristã já que certas normas de comportamento para seus adeptos não ultrapassam o âmbito do particular e não gozam de valor universal, próprio da ética.

Sob outro sentido, a ética cristã pretende revelar algo que pertence ao ser humano como tal, já que Jesus Cristo se fez homem e levou o caráter de humanidade ao extremo. Leonardo Boff afirma que “humano assim, só pode ser Deus”. O Deus em Jesus revela o humano em plenitude. Mesmo que a razão humana histórica não o tenha descoberto antes, no momento em que se defronta com a ética de Jesus, reconhece nela a si mesma. Nesse sentido, a ética cristã aponta para o extremo de perfeição da ética da razão, que é universal. Portanto, existe uma ética cristã que ao mesmo tempo é simplesmente ética.

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