A cada dia surgem empresas que vendem fiança, denominadas “garantidoras”, prometendo aos locadores o recebimento dos aluguéis, IPTU, taxa de condomínio, multa e os reparos do imóvel, até um valor-limite predeterminado, mesmo nos casos em que o inquilino se torna inadimplente. Mas, na prática, não é isso que vemos ao analisar com cuidado os contratos: quando o inquilino atrasa quatro meses, a garantidora se exonera. Mesmo que o inquilino venha a quitar a dívida integralmente para manter a locação, o locador passa a não ter mais a fiança.
Os locadores ficam surpresos ao perceber que a garantidora é excelente para gerar lucro pra ela e para quem promove esse produto. Entretanto, caso o inquilino não consiga outro fiador no prazo de 30 dias, o locador passa a assumir todo o risco de prejuízos, tendo como opção contratar um advogado para entrar com ação de despejo por falta de garantia. E, ao conseguir retomar o imóvel, o locador constatará que ficou sem condições de exigir judicialmente do inquilino o pagamento dos aluguéis, pintura e reparos pendentes. É notório que é na fase final da locação que ocorre a maioria dos calotes.
Esse problema não acontece nas locações garantidas por pessoas naturais que assumem o papel de fiadoras, pois, após o inquilino quitar a dívida, inclusive em juízo, essas continuam como garantidoras até a entrega das chaves para o locador. Todavia, pelo fato de a garantidora se recusar a manter a fiança mesmo tendo o inquilino quitado a dívida, cria-se uma situação que força o locador a despejar o inquilino, ficando seu imóvel vazio para obter nova locação, o que pode demorar e gerar prejuízos.
Cabe à imobiliária avisar ao seu locador sobre essa fragilidade, além das surpresas inseridas nos contratos que são descobertas somente quando acontece a impontualidade, como prazo exíguo para cumprir procedimentos; liberdade para a fiadora deixar de ser garantidora quando bem entender, inclusive se o inquilino cancelar o cartão de crédito; multa, juros e pintura como prejuízos não indenizáveis; determinação de que, se o inquilino impugnar o valor do aluguel/encargos ou realizar sublocação mesmo sem o conhecimento do locador, não há pagamento pela garantidora, entre outros.
É importante os corretores de imóveis e administradoras refletirem sobre o dever de proteger os proprietários que confiam na sua orientação sobre o tipo de garantia adequada.
Tendo o locador sido esclarecido e aceitado a garantidora como fiadora, tudo bem. Que seja concluída a locação. Não poderá o locador reclamar depois de omissão ou imperícia da imobiliária se ocorrerem prejuízos decorrentes da perda da fiança.
Numa área que abrange tantas leis e que está sujeita à atuação de aproveitadores, que se servem do vício das pessoas que não leem contratos longos, impõe-se o dever de os diretores das imobiliárias estudarem as centenas de cláusulas e parágrafos do contrato da garantidora, que contrariam, inclusive, as promessas verbais daqueles que promovem a venda da fiança.
Kênio Pereira
Advogado e diretor regional da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário