LEONARDO BOFF

As análises econômicas atuais e a ilusão de um crescimento ilimitado

Redação O Tempo


Publicado em 25 de novembro de 2016 | 03:00
 
 
 
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Sigo com atenção as análises econômicas que são feitas no Brasil e no mundo. Com raras e boas exceções, a grande maioria dos analistas é refém do pensamento único neoliberal mundializado. Raramente faz uma autocrítica que rompa a lógica do sistema produtivista, consumista, individualista e antiecológico. E, aqui, vejo um grande risco, seja para a biocapacidade do planeta Terra, seja para a subsistência da nossa própria espécie.

Meu sentido de mundo me diz que, se não tomarmos absolutamente a sério dois fatores fundamentais, podemos conhecer cataclismos ecológico-sociais de dimensões dantescas: o fator ecológico, de teor mais objetivo, e o resgate da razão sensível, de viés mais subjetivo.

Quanto ao fator ecológico: em sua maior parte, a macroeconomia ainda alimenta a falsa ilusão de um crescimento ilimitado, no pressuposto ilusório de que a Terra dispõe de recursos igualmente ilimitados e que possui grande resiliência para suportar a sistemática exploração a que é submetida. Nesse sentido, o que deve ser garantido são o lucro dos acionistas e a acumulação de riqueza em níveis inimagináveis, que deixariam Karl Marx enlouquecido.

A gravidade reside no fato de que as instâncias que se ocupam com o estado da Terra, como a ONU, que denunciam a crescente erosão de quase todos os itens fundamentais para a continuidade da vida, não são tomadas em conta. A razão é que são antissistêmicas, prejudicam o crescimento do PIB e os ganhos das grandes corporações.

Os cenários projetados por sérios centros de pesquisa são cada vez mais perturbadores. O aquecimento, por exemplo, não cessa de aumentar, como se afirmou em Marrakech na COP 22. A temperatura global de 2016 ficou 1,35°C acima do normal para o mês de fevereiro, a mais alta dos últimos 40 anos. O cientista David Carlson, da Organização Meteorológica Mundial, uma agência da ONU, declarou: “Isso é espantoso. A Terra certamente é um planeta alterado”.

Tanto a Carta da Terra quanto a encíclica do papa Francisco “Laudato Si: Como Cuidar da Casa Comum” alertam sobre os riscos que a vida corre sobre o planeta. A Carta da Terra é contundente: ou formamos uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros, ou arriscamos nossa destruição e a da diversidade da vida.

Nos debates sobre economia, em quase todas as instâncias, os riscos e o fator ecológico nem sequer são nomeados. A ecologia não existe, mesmo nas declarações do PT, nas quais a palavra “ecologia” nem aparece. E assim, gaiamente, poderemos trilhar um caminho sem retorno, por ignorância, irresponsabilidade e cegueira produzida pela volúpia da acumulação de bens materiais.

Donald Trump declarou que o aquecimento global é um embuste e que cancelará o Acordo de Paris, já assinado por Barack Obama. Paul Krugman, Nobel de economia, alertou que tal decisão poderá significar um grave dano aos Estados Unidos e ao planeta inteiro.

Conclusão: ou incorporamos o dado ecológico em tudo o que fizermos, ou, então, nosso futuro não estará garantido. A estupidez da economia nos cega e nos prejudica.

Temos que resgatar a razão sensível, a mais ancestral em nós. Nela residem a sensibilidade, o mundo dos valores, a dimensão ética e espiritual. Aí residem as motivações para cuidarmos da Terra e para nos engajarmos em um novo tipo de relação amigável com a natureza.

Temos, portanto, que articular os dois fatores – o ecológico e o sensível –, caso contrário dificilmente escaparemos da ameaça de um colapso do sistema vida.

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