O Brasil vive uma sucessão de crises. As frentes são as mais diversas possíveis, assim como seus desdobramentos. No centro de todas está o comportamento beligerante e mercurial de Bolsonaro, que importou para o Planalto o mesmo procedimento de seus anos como parlamentar. O embate fomenta sua agenda e conduz sua Presidência, o que gera instabilidade e incerteza, muito longe daquilo que o país precisa para vencer seus desafios.
Sabemos que a crise sanitária poderia ter um impacto muito menor do que o que vemos hoje. A nação assistiu atônita à escalada de mortes por meses a fio, encontrando sinalização de melhora apenas com a chegada das vacinas. A negação da pandemia, seguida diretamente pela estratégia de tratamento precoce ineficaz e pela tardia compra de imunizantes, jogou o Brasil em uma espiral de mortes e hospitalizações que não encontra paralelo em nossa história.
A crise sanitária teve impacto na crise econômica, mas seria bem menor se o governo tivesse tratado da pandemia com a devida atenção. Além disso, a ausência de reformas tornou o Brasil pouco atrativo para investimentos. As privatizações não ocorreram, quebrando uma promessa de campanha, e o desajuste fiscal extrapolou todos os limites imaginados. O resultado é desemprego, inflação e desinvestimento.
Ao criar um clima beligerante com os governadores, Bolsonaro inaugurou a crise federativa. Foram poucos aqueles que conseguiram fugir da fúria do presidente, seja em ataques diretos, via redes sociais ou represálias econômicas. A relação pessoal se sobrepôs ao comportamento institucional que deve nortear a relação entre governantes. O resultado é um desalinhamento entre Palácio do Planalto e governadores, que gera desdobramentos dramáticos para a população, especialmente em tempos de pandemia.
A conflagração subiu mais um degrau quando chegou até a relação entre os Poderes, tragando para uma guerra desnecessária os ministros da Corte constitucional brasileira, parlamentares e a Presidência da República. O clima entre o Planalto e os ministros do Supremo Tribunal Federal alcançou o patamar do inimaginável com o pedido de impeachment de um membro da Corte pelo presidente da República, depois de ofensas e ameaças que tensionaram a relação.
O diálogo com o jornalismo nunca foi amistoso, mas Bolsonaro desconhece limites ao tratar com um dos pilares da liberdade e da democracia. Ao denegrir, atacar e agredir com insultos um amplo leque de jornalistas, especialmente aqueles imbuídos de fazer as perguntas que incomodam o presidente, Bolsonaro criou uma crise com a imprensa.
Ao colher desacertos em tantas frentes, percebe-se que a instabilidade não está em cada um desses lugares, mas naquele que busca a tensão e enfrentamento constantes, um movimento responsável por instaurar um clima terrível, que acaba por enfraquecer a democracia brasileira. Antes de termos uma crise sanitária, econômica, federativa, institucional e com a imprensa, temos uma crise de Bolsonaro com o país. Ao transbordar seu comportamento intolerante, beligerante e mercurial, ele traga o Brasil para o centro de sua fantasia, deixando um rastro de instabilidade e incerteza.