Paulo Cesar de Oliveira

Centrão volta forte

Como ficam os que se comprometeram com o discurso de palanque?


Publicado em 11 de maio de 2020 | 15:02
 
 
 
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Seria um ato político normal. Um presidente eleito sem base, sem um programa definido, buscar formar essa sustentação parlamentar em negociações com legendas que não estiveram alinhadas à sua candidatura, mesmo que distantes também do outro candidato que chegou à segunda etapa da disputa.

Normal também que se ofereçam aos novos aliados cargos para que participem da gestão que vão sustentar. Não se pode querer que os novos alinhados entrem na roda apenas como homologadores de decisões do grupo de poder. Que sejam, então, sócios nos acertos e dos erros, posto que tenham que prestar contas às urnas nas eleições seguintes.

Pensar em altruísmo em política é ser ingênuo a ponto de colocar o sapatinho na janela para o Papai Noel. O que causa estranheza nessa composição que o presidente Bolsonaro busca com o chamado grupo do “centrão” é a naturalidade com que trocou o discurso, o que também não é fato raro na política, muito especialmente na brasileira.

Bolsonaro e seus áulicos fizeram da campanha um “sambinha de uma nota só”, prometendo varrer do país a velha política que, para eles, se materializava no hoje amigo “centrão”, que se sustenta no “é dando que se recebe”. Como precisa receber, e em alguns temas, como impeachment, receber rápido, o presidente foi buscar apoio aonde sabia que encontraria barato.

E como ficarão nesta história os que, sem cintura política, se comprometeram com o discurso de palanque do presidente? Como ficará, por exemplo, o general Heleno, hoje titular do GSI, de discurso duro contra a corrupção que, num ato de candidatura de Bolsonaro, em 2018, encerrou seu discurso com uma paródia de música interpretada por Bezerra da Silva, substituindo “ladrão” por “centrão”. Cantou – até que afinado – “se gritar ‘pega centrão’, não fica um meu irmão...”

Pois é! O presidente gritou e vai pegando todo mundo. Que constrangimento causará a seus áulicos que, inocentes, acreditaram na fala brava de palanque, esquecendo-se de que em política não há verdade que dure 24 horas? Como será a convivência no governo com os antes ladrões, hoje aliados indispensáveis? Questão complicada para os que se julgam durões e contrários ao que alardeavam como a velha política a ser banida da vida nacional. Na minha infância ouvi muitas vezes minha mãe advertindo que “quem com os porcos se mistura farelo come”. Fala-se de Roberto Jefferson, Waldemar Lopes, entre tantos,

Essa mágica que o presidente Bolsonaro está apresentando no picadeiro político é a triste realidade da vida brasileira. Desde sempre (talvez tenha sido um pouco diferente nos tempos de UDN e PSD) é impossível escolher um candidato pelo grupo que ele representa, pelo pensamento político deste grupo.

Aqui entre nós, disputa-se eleição sem que se tenha que apresentar uma proposta de governo, sem debater ideias. Apenas, e isso é mais forte na oposição, se ataca o adversário, transformado em inimigo. Manipula-se o eleitor com um falso discurso de mudança, sem mostrar a ele o quê e como se pretende mudar. E o eleitor, que posa de sério, de incorruptível, aceita. Vota. Depois xinga. E vota outra vez para xingar depois.

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